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Decisão do colegiado de 16/01/2018

Participantes

• MARCELO BARBOSA - PRESIDENTE
• GUSTAVO MACHADO GONZALEZ* - DIRETOR
• GUSTAVO RABELO TAVARES BORBA - DIRETOR
• HENRIQUE BALDUINO MACHADO MOREIRA - DIRETOR
• PABLO WALDEMAR RENTERIA - DIRETOR

* Por estar em São Paulo, participou por videoconferência.

RECURSO CONTRA DECISÃO DA SRE - REGISTRO DE OFERTA PÚBLICA DE DISTRIBUIÇÃO DE CERTIFICADOS DE RECEBÍVEIS IMOBILIÁRIOS - CM CAPITAL MARKETS DTVM LTDA. E OUTRO - PROC. SEI 19957.008927/2017-73

Reg. nº 0894/18
Relator: SRE/GER-1

Trata-se de recurso interposto por CM Capital Markets DTVM Ltda. e Barigui Securitizadora S.A. (“Recorrentes”) contra decisão da Superintendência de Registros de Valores Mobiliários - SRE, no âmbito do pedido de registro da oferta pública de distribuição de Certificados de Recebíveis Imobiliários das séries 62ª e 63ª da 1ª emissão da Barigui Securitizadora S.A.

O presente recurso questiona exigência formulada pela SRE, mais especificamente pela Gerência de Registros 1 – GER-1, no sentido de excluir “Instrumentos Particulares de Empréstimo com Pacto Adjeto de Alienação Fiduciária de Imóvel Em Garantia” dos créditos que serviriam de lastro para a emissão em questão.

Em suas razões recursais, as Recorrentes ressaltam que a manifestação da CVM a respeito da definição de crédito imobiliário se evidencia necessária em prol da segurança jurídica do mercado imobiliário e de capitais. Argumentam que “(...) o crédito com lastro em Contratos de Refinanciamento é um produto que tem a finalidade precípua de viabilizar crédito mais barato ao jurisdicionado, que atende às regras do disposto na Lei 9.514/97 e ainda, é definido pelo CMN e pelo Bacen como crédito imobiliário (...)”

As Recorrentes requereram ainda que lhes fosse possibilitada sustentação oral do recurso na sessão em que fosse apreciado pelo Colegiado da CVM.

Em sua análise, constante do Memorando nº 1/2018-CVM/SRE/GER-1, a SRE destacou que a Lei nº 9.514/1997 (“Lei 9.514”) não define crédito imobiliário, de forma que a CVM vem construindo o entendimento sobre esse tema caso a caso, por meio de apreciação do Colegiado. Em específico, reforçou que a possibilidade de emissão de CRI lastreado em empréstimos garantidos por alienação fiduciária de imóveis não teve, até o momento, a oportunidade de ser apreciada pelo Colegiado.

Entre outros argumentos trazidos pela área técnica, ressaltou-se que os créditos em questão não se enquadrariam no conceito de crédito imobiliário seja em sua origem, seja em sua destinação. Ainda, em comparação a produtos como LCI e LIG, o CRI apresentaria características distintas, merecendo interpretação diferenciada quanto às possibilidades de lastro.

Em conclusão, a área técnica manifestou-se no sentido de que “a oferta só possa ser registrada após a exclusão dos “Instrumentos Particulares de Empréstimo com Pacto Adjeto de Alienação Fiduciária de Imóvel em garantia” entre seus lastros, tendo em vista que, em nosso entendimento, tais Instrumentos não podem ser considerados créditos imobiliários para fins de lastro de CRI, nem na origem, tampouco na sua destinação, pois os mesmos não proveem da exploração ou do financiamento do imóvel, além de não haver qualquer previsão de direcionamento dos recursos a serem captados por meio da oferta a imóveis previamente identificados”.

Quanto ao pedido das Recorrentes de que lhes fosse possibilitada a sustentação oral, em linha com a Decisão do Colegiado de 09.10.2007 no âmbito do Proc. RJ2007/7345, a SRE entendeu ser desnecessário o atendimento ao referido pleito, por falta de previsão legal.

Os Diretores Pablo Renteria, Henrique Machado e Gustavo Gonzalez divergiram do entendimento da área técnica, votando a favor do provimento do recurso. De acordo com os Diretores, o empréstimo a pessoal natural com pacto adjeto de alienação fiduciária de imóvel em garantia constitui crédito imobiliário na sua origem, uma vez que o proprietário tira proveito econômico do seu imóvel, mediante a outorga da garantia real, para obter recursos a custos reduzidos. Ademais, nessa modalidade de mútuo, verifica-se a vinculação do valor de alienação do imóvel à satisfação do crédito, visto que o credor tem a segurança de receber a prestação devida a partir do produto obtido com a execução da garantia, em caso de inadimplemento.

De outra parte, no caso em análise, a pertinência desse empréstimo com o mercado imobiliário é evidenciada pelo fato de o originador ser companhia hipotecária, integrante do Sistema Financeiro Imobiliário (Lei 9.514, art. 2º) e do Sistema Financeiro Habitacional (Lei nº 4.380/1964, art. 8º, VI), que tem por objeto típico a concessão de empréstimos e financiamentos garantidos por alienação fiduciária de bens imóveis (Resolução CMN nº 2.122/1994, art. 3º, II). Assim, ao permitir-se que o mútuo sirva de lastro para a emissão do CRI, contribui-se para a expansão das atividades desempenhadas por esse participante do mercado imobiliário.

Além disso, a admissão dessa modalidade de empréstimo como lastro de CRI se mostra consentânea com o entendimento que vem sendo adotado pelo Banco Central do Brasil e o Conselho Monetário Nacional a respeito da qualificação do crédito imobiliário, como se vê da Circular BACEN nº 3.614/2012, relativa à letra de crédito imobiliário – LCI, e da Resolução CMN n º 4.598/2017, que regulamentou a letra imobiliária garantida – LIG. Trata-se, portanto, de interpretação sobre o conceito de crédito imobiliário que promove a coerência regulatória entre os diferentes instrumentos de captação de recursos utilizados no âmbito do mercado imobiliário.

Os Diretores destacaram ainda que a análise técnica da SRE não identificou riscos aos investidores ou ao bom funcionamento do mercado de valores mobiliários que poderiam advir da qualificação desse crédito como lastro de CRI. Ao reverso, o fato de ser um empréstimo dotado de garantia fiduciária imobiliária, concedido por instituição integrante do sistema financeiro segundo a regulamentação do Banco Central do Brasil, é um fator que tende a atenuar o risco assumido pelo adquirente do CRI. Na mesma direção, o fato de o Banco Central do Brasil e o Conselho Monetário Nacional aceitarem esse tipo de lastro para a LCI e a LIG constitui outra evidência da adequação material dessa interpretação, sob o aspecto regulatório.

Por fim, os Diretores Pablo Renteria, Henrique Machado e Gustavo Gonzalez ressaltaram a importância de a CVM continuar a desenvolver estudos sobre a extensão do conceito de crédito imobiliário e suas repercussões no funcionamento e desenvolvimento do mercado de valores mobiliários.

Por sua vez, o Presidente Marcelo Barbosa e o Diretor Gustavo Borba, acompanhando o entendimento da área técnica, votaram pelo não provimento do recurso, por entenderem que a aceitação de “Instrumentos Particulares de Empréstimo com Pacto Adjeto de Alienação Fiduciária de Imóvel Em Garantia” como créditos imobiliários passíveis de lastrear CRIs não encontraria respaldo jurídico, tendo em vista as disposições da Lei 9.514, a qual não define créditos imobiliários, e a falta de elementos que caracterizem a operação pretendida, mesmo do ponto de vista conceitual, como uma operação de financiamento imobiliário.

Nesse sentido, tais contratos de empréstimo não se enquadrariam nos conceitos de crédito imobiliário pela origem ou pela destinação construídos nas decisões do Colegiado da CVM, não sendo certa sua utilização para a finalidade de financiamento imobiliário preceituada pela Lei 9.514. A esse respeito, corroboraram o entendimento da SRE de que além de o fluxo de pagamento de uma operação de securitização com lastro em mútuos não ter origem na exploração ou financiamento de imóveis, a destinação de tais recursos também não estaria vinculada a nenhuma atividade relacionada ao setor imobiliário, tendo em vista que nos empréstimos em análise a destinação seria livre. Em seu entendimento, o fato de existir uma garantia de natureza imobiliária não transforma a natureza do crédito em si, considerando inclusive o caráter acessório e substituível da garantia. Nesse tocante, pontuaram que a Lei 9.514 dispõe que o crédito – e não apenas sua garantia – tem que estar vinculado a imóveis.

Quanto ao argumento de que os conceitos de crédito imobiliário previstos nas normas relativas a outros produtos bancários, quais sejam, a LIG e a LCI, incluem empréstimos garantidos por alienação fiduciária de bens imóveis, o Presidente Marcelo Barbosa e o Diretor Gustavo Borba, em linha com o posicionamento da área técnica, salientaram que se trata de instrumentos de natureza e com especificidades diversas. A título de exemplo, mencionou-se que a composição da carteira de ativos que lastreia LIGs seria mais flexível, podendo ser composta por até 20% de títulos públicos, e que, enquanto CRIs são emitidos por companhias securitizadoras, LCIs e LIGs somente podem ser ofertadas por entidades autorizadas a operar do Sistema de Financiamento Imobiliário, de modo que estes títulos atingiriam naturalmente o objetivo legal de financiamento imobiliário.

Assim, embora entendam que uma interpretação mais flexível do conceito poderia permitir uma expansão das possibilidades de financiamento via mercado de capitais, operação atualmente disponível apenas por meio de financiamento bancário, o Presidente Marcelo Barbosa e o Diretor Gustavo Borba entenderam que o alargamento pretendido poderá ser feito, se for o caso, via regulação, quando se poderá ponderar, de forma mais sistemática, todos os aspectos envolvidos.

Dessa forma, o Colegiado decidiu (i) por unanimidade, acompanhando a conclusão da área técnica, não conceder a possibilidade de sustentação oral às Recorrentes; e (ii) por maioria, divergindo do entendimento da área técnica, prover o recurso para admitir que os “Instrumentos Particulares de Empréstimo com Pacto Adjeto de Alienação Fiduciária de Imóvel em Garantia” sirvam de lastro para o CRI.

 

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