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Decisão do colegiado de 05/11/2019

Participantes

·   MARCELO BARBOSA – PRESIDENTE
·   CARLOS ALBERTO REBELLO SOBRINHO – DIRETOR
·   HENRIQUE BALDUINO MACHADO MOREIRA – DIRETOR
·   GUSTAVO MACHADO GONZALEZ – DIRETOR
·   FLÁVIA MARTINS SANT’ANNA PERLINGEIRO – DIRETORA

RECURSO CONTRA DECISÃO DA SEP – REAPRESENTAÇÃO DO BOLETIM DE VOTO A DISTÂNCIA – VALE S.A. – PROC. SEI 19957.004385/2019-21

Reg. nº 1389/19
Relator: DCR

Trata-se de recurso interposto por Vale S.A. (“Recorrente” ou “Companhia”) contra decisão da Superintendência de Relações com Empresas – SEP que determinou a reapresentação do boletim de voto à distância (“BVD”) divulgado pela Companhia em 10.4.2019, referente à Assembleia Geral Ordinária e Extraordinária (“AGO/E”) convocada para 30.4.2019.

O processo originou-se a partir de consulta formulada pela Recorrente a respeito da solicitação de grupo de acionistas para a indicação de candidato à eleição do conselho de administração da Companhia, a qual estaria condicionada à adoção do procedimento de voto múltiplo, nos termos do art. 141, §1º da Lei nº 6.404/76.

Em resposta à consulta, a SEP enviou ofício esclarecendo que, em vista das limitações do processo de votação à distância, não seria possível ao candidato participar da eleição tão somente caso adotado o procedimento de voto múltiplo. Nada obstante, determinou que a Companhia reapresentasse o BVD “de modo a fazer constar o candidato indicado pelos minoritários e seu respectivo suplente na eleição geral e, por conseguinte, em caso de adoção do processo de eleição por voto múltiplo”, para o que deveria se valer do item 12-C do Anexo 21-F da Instrução CVM nº 481.


O BVD foi reapresentado pela Companhia em 10.4.2019 com os seguintes campos: (i) “eleição do conselho de administração por chapa única” (item 12-A do Anexo 21-F), com a relação dos candidatos integrantes da chapa indicada pelos signatários do acordo de acionistas, já refletida na versão original do BVD; e (ii) “eleição do conselho de administração por candidato – limite de vagas a serem preenchidas: 1”, com a indicação do candidato e do suplente apontados pelo grupo de acionistas (item 12-C do Anexo 21-F).


A SEP entendeu, no entanto, que o BVD, na forma reapresentada, estaria irregular, pois teriam sido incluídas, indevidamente, duas modalidades de eleição majoritária. Esclareceu a área técnica que a recomendação de que fosse utilizado o item 12-C do Anexo 21-F da Instrução CVM nº 481 pressuporia que a eleição majoritária passasse a observar o procedimento de votação por candidato, do qual participariam tanto os candidatos originalmente integrantes da chapa quanto o candidato indicado pelo grupo de acionistas minoritários. Nestes termos, a SEP determinou nova reapresentação do BVD pela Companhia.


Em 12.4.2019, a Companhia apresentou recurso alegando, em síntese, que (i) o BVD reapresentado em 10.4.2019 não poderia ser considerado irregular, visto que, além de atender à orientação da SEP, permitiria aos acionistas interessados alocarem 100% de seus votos no candidato indicado pelo grupo de acionistas minoritários na hipótese de adoção do voto múltiplo; (ii) faltaria competência à SEP para determinar a dissolução da chapa apresentada pelos signatários do acordo de acionistas, haja vista que a definição da sistemática a ser adotada na eleição majoritária (por chapa ou por candidato) caberia à assembleia; (iii) a possibilidade de o acionista apresentar candidato no boletim, prevista no art. 21-L da Instrução CVM nº 481, não deveria impedir que os demais acionistas apresentassem chapas para o conselho; e (iv) não obstante a relevância do BVD, tal instrumento não seria capaz de emular todos os cenários possíveis na dinâmica da assembleia geral.


Ao examinar o recurso, a SEP esclareceu que (i) não haveria vedação legal a que determinado candidato participasse da eleição ao conselho de administração apenas caso adotado o procedimento de voto múltiplo, o que poderia ocorrer, inclusive, na votação presencial; (ii) a impossibilidade vislumbrada pela área técnica inicialmente decorreria das limitações da sistemática de votação à distância; (iii) diante destas limitações, a orientação de que se utilizasse o item 12-C do Anexo 21-F para viabilizar a solicitação dos acionistas minoritários seria, na visão da SEP, a opção mais adequada em termos de governança e permitiria aos acionistas compreender o procedimento da eleição geral, evitando incertezas e questionamentos.


Adicionalmente, a área técnica registrou o seu entendimento de que a prerrogativa da Companhia e dos signatários do acordo de acionistas de indicar chapa para concorrer ao conselho de administração não poderia conflitar com a faculdade de os demais acionistas indicarem candidatos à referida eleição, sem que estejam compelidos a apresentar chapa completa concorrente.


Ao final, a área técnica manteve a sua conclusão quanto à irregularidade do BVD divulgado pela Companhia em 10.4.2019 por (i) não disponibilizar aos acionistas minoritários a faculdade prevista no artigo 21-L, inciso I, da Instrução CVM nº 481 tendo em vista que, aparentemente, na visão da Companhia, o acionista teria que obrigatoriamente indicar chapa com 12 membros; (ii) apresentar três regimes de votação, e não dois, conforme previsto na Lei nº 6.404/76; e (iii) não permitir ao acionista votar, simultaneamente, em candidatos tanto da chapa dos signatários do acordo de acionistas, quanto no candidato dos minoritários.


Em sua manifestação de voto, o Diretor Relator Carlos Rebello reconheceu, de início, que, em vista do transcurso da AGO/E de 30.4.2019 e da eleição do candidato indicado pelo grupo de acionistas minoritários pelo procedimento do voto múltiplo, o recurso interposto pela Companhia teria perdido o seu objeto.


Ainda assim, considerando a relevância da temática suscitada ao longo do presente processo, o Diretor entendeu ser oportuna a manifestação do Colegiado a respeito da possibilidade de o acionista (i) condicionar a indicação de candidato ao conselho de administração à adoção do procedimento de voto múltiplo; e (ii) exercer a faculdade descrita no art. 21-L, inciso I, da Instrução CVM nº 481 indicando candidato individualmente, em especial no cenário em que a proposta inicial para a eleição majoritária dos membros do conselho preveja chapa de candidatos.


Em relação ao primeiro tema, o Diretor Carlos Rebello ressaltou que, à luz das disposições da Lei nº 6.404/76, não haveria qualquer limitação ou restrição às circunstâncias em que o acionista pode indicar candidato para concorrer às vagas do conselho de administração, de modo que, a contrario sensu, a sua participação apenas na hipótese de adoção do procedimento de voto múltiplo na eleição geral não importaria violação à legislação societária.


Na visão do Diretor, a incompatibilidade vislumbrada no presente caso decorreria, na realidade, do formato de BVD atualmente previsto na Instrução CVM nº 481. Isso porque o campo destinado a simular a alocação de votos pelo acionista, caso venha a ser adotado o procedimento de voto múltiplo, está vinculado aos itens 12-A a 12-C, referentes às modalidades de eleição majoritária, e, por conseguinte, apenas replica os candidatos que já concorriam, seja pela votação por chapa, seja por candidato.


Diante disso, o Diretor Relator apresentou proposta, a ser avaliada no curso do processo regular de normatização, de alteração do Anexo 21-F da Instrução CVM nº 481 com o objetivo de dissociar o questionamento da distribuição de votos no procedimento de voto múltiplo dos itens relativos à votação majoritária (itens 12-A a 12-C).


No que diz respeito ao segundo tema, o Diretor Carlos Rebello concluiu, novamente, que a controvérsia resultaria das limitações da sistemática de votação à distância, visto que o BVD não contempla a hipótese em que o acionista é chamado a decidir sobre o regime de votação a ser adotado na eleição majoritária. Presencialmente, a existência de duas propostas para a eleição majoritária, uma refletindo a votação por chapa e a outra por candidato, não imporia maiores dificuldades, sendo tal decisão submetida à deliberação dos acionistas votantes presentes na assembleia.


Assim, aventou o Diretor Relator a possibilidade de replicar essa dinâmica no BVD, tendo reconhecido, no entanto, que tal alteração poderia agregar complexidade indesejada ao procedimento de votação à distância e, por esta razão, recomendado a avaliação de sua conveniência em sede de regulação.


O Diretor Carlos Rebello ressaltou que não haveria respaldo legal ou regulamentar que autorizasse a CVM a impor à Companhia a adoção das soluções aventadas pela SEP, quais sejam: (i) incluir o candidato dos minoritários no item 12-C do Anexo 21-F, passando a adotar a votação por candidato na eleição majoritária; ou, ainda, (ii) propor “uma maneira de fazer incluir (em alguma chapa) o candidato indicado pelo minoritário”.


Ainda assim, na visão do Diretor, caberia incentivar, como boa prática de governança, a adoção de soluções alternativas que permitissem contemplar na sistemática de voto a distância tanto os candidatos indicados na proposta da administração quanto eventuais indicações apresentadas por outros grupos de acionistas.


Por fim, a despeito de reconhecer a perda do objeto do recurso interposto pela Vale e não vislumbrar irregularidade ou, ainda, falta de comprometimento da Vale em dar cumprimento à solicitação de inclusão de novo candidato ao conselho de administração, o Diretor Relator registrou, para orientação de casos futuros, que partilharia das conclusões da SEP quanto à inadequação do BVD divulgado pela Companhia em 10.4.2019.


A Diretora Flávia Perlingeiro e o Presidente Marcelo Barbosa acompanharam o Diretor Relator Carlos Rebello.


O Diretor Gustavo Gonzalez, por sua vez, apresentou manifestação de voto concordando ser conveniente que o Colegiado aproveitasse a oportunidade para dirimir as divergências que motivaram o recurso. Entendeu, contudo, não ser oportuno, nesse momento, antecipar recomendações para futuras reformas da Instrução 481, em especial no tocante ao voto à distância.


Para Gonzalez, as inúmeras variáveis que a lei societária brasileira admite para o processo de eleição do conselho de administração tornam difícil, senão impossível, capturar de forma completa no BVD todas as alternativas que se apresentam ao acionista que participa presencialmente da deliberação. Ademais, para o diretor, os esforços de “fazer com que o boletim de voto à distância permita ao acionista dizer como quer votar em cada um dos possíveis cenários torna o documento cada vez maior, mais complexo e, consequentemente, difícil de ser preenchido. Há, portanto, o risco de que, no intuito de aperfeiçoar a participação dos acionistas nessa importante deliberação, se criem novos empecilhos para o exercício do voto. Esse fato assinala a complexidade da matéria e a necessidade de que qualquer revisão seja feita de forma discutida, refletida e ponderada”.


Para o Diretor Gustavo Gonzalez, o Colegiado deveria se manifestar sobre três pontos.


O primeiro deles se refere à possibilidade de o acionista condicionar a indicação de um candidato à adoção de determinado procedimento de eleição do conselho de administração. Para o diretor, não há dúvida quanto à possibilidade de o acionista modificar sua estratégia de participação em razão do procedimento que será adotado na eleição do conselho de administração. A verdadeira questão seria, portanto, como compatibilizar essa prerrogativa com os procedimentos fixados na regulamentação para organizar o voto à distância. O diretor ressaltou que a norma regulamentar deve necessariamente ser interpretada à luz da lei, não podendo contradizer o que estabelece a lei ou alterar os direitos dos acionistas.


No caso dos autos, o investidor fez um pedido condicionado e, no momento de conclusão do BVD, a condição por ele colocada não havia sido implementada. Com relação à demanda da SEP, o diretor entendeu que não competia à CVM fixar o procedimento para votação majoritária.


O segundo ponto se refere à competência para definir o procedimento que será utilizado na votação majoritária. O Diretor Gustavo Gonzalez ressaltou que, na vasta maioria das companhias abertas brasileiras, a decisão costuma ser tomada pela administração, mas destacou que, no regime da lei brasileira, salvo disposição estatutária regulando a matéria, o procedimento de eleição previsto no material preparado pela administração consiste em mera proposta que pode ser revista pelos acionistas durante o conclave. Para Gonzalez, os problemas que essa eventual alteração traz para a dinâmica do voto à distância, por mais sérios que sejam, não autorizam transferir competência de um órgão para outro. O Diretor destacou, contudo, que nas companhias com controle definido é esperado que o material preparado pela administração reflita o procedimento que o controlador, ou o bloco de controle, conforme o caso, pretende adotar na eleição do conselho de administração por votação majoritária. Assinalou, por fim, entender que idealmente cada companhia deveria fixar em seu estatuto social o procedimento que irá adotar nas eleições do seu conselho de administração por votação majoritária, reconhecendo, contudo, que essa prática é adotada por poucas companhias.


Por fim, o terceiro ponto abordado pelo Diretor Gustavo Gonzalez em sua manifestação se refere à forma de votação em candidato que não faz parte da(s) chapa(s) constante(s) do material submetido aos acionistas antes da assembleia geral. O Diretor destacou que existem duas formas de organizar a eleição do conselho de administração por meio de votação majoritária: por chapa ou nome a nome. A forma escolhida determinará a forma como os acionistas votarão na matéria: no caso da votação por chapa, o acionista profere um único voto em uma chapa indivisível; no caso da votação uninominal, cada ação confere um voto para cada assento a ser preenchido.


Para Gonzalez, dado que o teor do voto deve sempre corresponder a uma deliberação possível, quando a eleição do conselho de administração se dá por votação em chapa, o voto em um único candidato não é um voto válido, uma vez que não se pode admitir que, ao final do conclave, seja eleito apenas um conselheiro. Assinalou, por fim, entender não ser possível defender que o procedimento de votação deveria ser alterado em função de determinado acionista votar de forma diversa daquela escolhida para a votação.


O Diretor Henrique Machado acompanhou o entendimento do Diretor Relator quanto à perda do objeto do recurso, em razão do transcurso da AGO/E de 30.4.2019 e da eleição do candidato indicado pelo grupo de acionistas minoritários pelo procedimento do voto múltiplo. Deixou, entretanto, de apreciar o mérito das demais ponderações realizadas pelo Relator e pelo Diretor Gustavo Gonzalez, por entender que a matéria é típica do procedimento regular de normatização da autarquia. No seu entendimento, a diversidade de agentes envolvidos assim como a importância dos efeitos do entendimento desta Autarquia sobre as regras de votação à distância requerem a oitiva dos participantes de mercado e das pessoas que possam contribuir com informações ou opiniões para o aperfeiçoamento normativo. Nada obstante, recomendou que as pertinentes observações e sugestões consignadas nas manifestações de voto sejam consideradas por oportunidade do mencionado processo normativo.

 

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