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Decisão do colegiado de 14/07/2017

Participantes

• LEONARDO PORCIUNCULA GOMES PEREIRA - PRESIDENTE
• HENRIQUE BALDUINO MACHADO MOREIRA - DIRETOR*
• PABLO WALDEMAR RENTERIA - DIRETOR

* Por estar em Brasília, participou por videoconferência.

RECURSO CONTRA DECISÃO DA SEP - ANÁLISE DE IMPEDIMENTO DE VOTO EM AGE DA EMPRESA METROPOLITANA DE ÁGUAS E ENERGIA S.A. - EMAE - ESTADO DE SÃO PAULO - PROC. SEI 19957.005749/2017-29

Reg. nº 0728/17
Relator: SEP

Trata-se de recurso interposto pelo Estado de São Paulo (“Recorrente”) contra decisão da Superintendência de Relações com Empresas – SEP acerca do impedimento de voto do Recorrente em deliberação assemblear da Empresa Metropolitana de Águas e Energia S.A. – EMAE (“Companhia”) sobre proposta de acordo entre a EMAE e a Companhia de Saneamento Básico de São Paulo (“SABESP” e, em conjunto com a EMAE, “Companhias”).

O Acordo prevê o encerramento de litígios relacionados à captação de água, pela SABESP, de reservatórios da EMAE, sem a devida contraprestação. A eficácia do Acordo é condicionada à aprovação dos seus termos pela assembleia geral dos acionistas da EMAE, no prazo de um ano a contar da assinatura do Acordo pelas Companhias (que ocorreu em 28.10.2016).

Nesse sentido, a Companhia convocou assembleia geral extraordinária (“AGE”) da para o dia 6.7.2017 a fim de deliberar sobre o Acordo. Na sequência, foram apresentadas reclamações por investidores, questionando a CVM sobre potencial situação de conflito de interesses do Recorrente, acionista controlador das Companhias, nessa deliberação.

Considerando as conclusões da SEP no sentido de que o Recorrente e a Companhia do Metropolitano de São Paulo (“CMSP”), sua subsidiária integral, estariam em situação de impedimento de voto, nos termos do art. 115, §1º, da Lei nº 6.404, de 1976 (“Lei 6.404”), a deliberação foi suspensa a pedido do próprio Recorrente até que o Colegiado apreciasse a questão.

Em sua análise, consubstanciada nos Relatórios nº 64/2017, 66/2017 e 71/2017, a SEP entendeu que:

(i) considerando a participação do Recorrente nas Companhias (50,26% da totalidade de ações da SABESP; e 39,94% da totalidade de ações da EMAE), quanto menor fosse o valor pago pela SABESP à EMAE, mais favorável o Acordo seria para o Recorrente, o que o colocaria em situação de conflito na deliberação;

(ii) a negociação supostamente independente entre os administradores das Companhias e a aprovação do Acordo pela ANEEL não interfeririam na situação de impedimento do Recorrente;

(iii) ainda que levada de forma facultativa à aprovação em AGE, sendo a matéria submetida à deliberação dos acionistas, aplicam-se as disposições legais pertinentes;

(iv) o impedimento de voto não pretende obstar negócios potencialmente benéficos para a companhia, mas apenas afastar da deliberação aqueles com interesse conflitante;

(v) conforme entendimento do Colegiado, o conflito de interesses não se restringiria às hipóteses de contratação direta entre acionista e companhia;

(vi) prevalece na Autarquia a jurisprudência que indica o impedimento de voto formal em detrimento da tese de impedimento de voto material; e

(vii) caso todos os acionistas com direito a voto estejam impedidos de votar, a Companhia poderia convocar assembleia de preferencialistas para deliberar sobre a matéria.

Em seu recurso, o Recorrente rebate os argumentos da SEP com base nas seguintes principais alegações:

(i) apenas se configuraria impedimento de voto por interesse conflitante direto entre acionista e companhia, o que não ocorreria no caso;

(ii) a prevalecer a interpretação da SEP, estar-se-ia restringindo, de forma desproporcional, o exercício de voto por acionistas com portfólio diversificado de ações (em tese impedidos de votar em transações envolvendo duas companhias de que sejam acionistas);

(iii) nem a lei nem o estatuto preveem direito de voto dos preferencialistas, de sorte que o entendimento da SEP inviabilizaria a própria deliberação sobre o Acordo em assembleia;

(iv) o impedimento estaria afastado por conta da aplicação analógica do art. 115, §2º, da Lei 6.404; e

(v) a solução legal para casos em que todos os acionistas com direito a voto se encontram impedidos seria tratar o conflito como material.

O Presidente Leonardo Pereira consignou manifestação de voto acompanhando as conclusões da SEP.

Em seu voto, inicialmente, Leonardo Pereira afastou qualquer juízo de mérito sobre o Acordo em si, ponderando que a finalidade do art. 115, §1º, da Lei 6.404 seria justamente assegurar que os acionistas da Companhia façam esse juízo livres de interesses conflitantes que possam prejudicar a formação da vontade social. O Presidente também ressaltou que, embora envolva sociedades de economia mista, o processo não discutiria a aplicabilidade do art. 238 da Lei 6.404, considerando que o Acordo aborda interesses eminentemente patrimoniais das Companhias.

Na sequência, o Presidente ressaltou que, na sua visão, como o Recorrente é controlador das Companhias, deveria exercer o seu poder de controle em benefício e no interesse de cada uma delas, conforme o art. 116 da Lei 6.404, razão pela qual, em se tratando de uma negociação de pagamento de indenização, seria logicamente impossível que o acionista estivesse alinhado e comprometido simultaneamente com ambos os interesses. O Presidente também destacou seu entendimento de que o impedimento seria intrínseco à relação acionária mantida pelo Recorrente nas Companhias, independentemente do tamanho das participações detidas.

Leonardo Pereira concluiu, também, que o impedimento de voto por conflito de interesses decorre de lei, não podendo ser afastado ainda que o Acordo tenha sido negociado pelas administrações das Companhias supostamente no seu melhor interesse, em linha com os deveres fiduciários e de acordo com o art. 245 da Lei 6.404.

Por fim, o Presidente salientou que o impedimento, no caso, dirige-se à figura do acionista controlador e não às ações ordinárias em si, não obstante o Recorrente seja titular de 100% das ações ordinárias de emissão da EMAE. A esse respeito, Leonardo Pereira concluiu que compete à administração da Companhia avaliar o encaminhamento mais adequado e alinhado aos interesses da EMAE quanto à condição suspensiva do Acordo, lembrando que, em casos semelhantes, a solução adotada foi a convocação de assembleia especial de acionistas preferencialistas para deliberar sobre a ordem do dia.

O Diretor Pablo Renteria acompanhou, em linhas gerais, a posição do Presidente, concluindo pelo impedimento de voto.

Na sua manifestação, Pablo Renteria também afastou da discussão o art. 238 da Lei 6.404, salientando que a questão relativa ao impedimento de voto do Estado de São Paulo seria examinada tal como se colocaria em qualquer companhia aberta.

Em seguida, o Diretor ponderou que, no caso, seria indiscutível o conflito de interesses incorrido pelo Estado de São Paulo, uma vez que também é acionista controlador da SABESP, que, por sua vez, é parte contratante do Acordo.

Pablo Renteria também afastou os argumentos do Recorrente, especialmente com relação à suposta aplicação analógica do art. 115, §2º, e à alegação de que o impedimento de voto inviabilizaria a consumação da transação. Quanto ao primeiro ponto, o Diretor salientou que, ao contrário da hipótese do art. 115, §2º, que requer a correspondência entre os acionistas impedidos e atingidos pelos efeitos da deliberação, no presente caso, o Acordo a ser firmado atinge, além dos interesses patrimoniais dos ordinaristas, também os interesses dos acionistas preferencialistas. No tocante ao segundo ponto, Pablo Renteria lembrou que a própria realização da assembleia seria facultativa, tendo sido estipulada por iniciativa e “excesso de zelo” da administração da Companhia para legitimar a comutatividade do negócio. Nesse sentido, concluiu que o impedimento de voto do Recorrente não prejudicaria a capacidade da administração de firmar acordo para por fim à disputa com a SABESP.

Após as manifestações, a reunião foi suspensa por pedido de vista do Diretor Henrique Machado.

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