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Decisão do colegiado de 10/11/2020

Participantes

• MARCELO BARBOSA – PRESIDENTE
• HENRIQUE BALDUINO MACHADO MOREIRA – DIRETOR
• FLÁVIA MARTINS SANT’ANNA PERLINGEIRO – DIRETORA
• ALEXANDRE COSTA RANGEL – DIRETOR

Reunião realizada eletronicamente, por videoconferência.

CONSULTA SOBRE PEDIDOS DE REGISTRO INICIAL DE EMISSOR ESTRANGEIRO DE VALORES MOBILIÁRIOS E DE REGISTRO DE OFERTA PÚBLICA DE DISTRIBUIÇÃO INICIAL PRIMÁRIA E SECUNDÁRIA DE BDR – NAVIOS SOUTH AMERICAN LOGISTICS INC. – PROCS. SEI 19957.005751/2020-01 E 19957.005729/2020-53

Reg. nº 1932/20
Relator: SEP/SRE

Trata-se de consulta protocolada em resposta ao Ofício-Conjunto nº 162/2020-CVM/SRE/SEP ("Ofício-Conjunto"), da Superintendência de Registro de Valores Mobiliários – SRE e da Superintendência de Relações com Empresas – SEP, enviado no âmbito do pedido de registro de emissor estrangeiro de valores mobiliários na Categoria A, nos termos do Artigo 2º, inciso I, da Instrução CVM nº 480/09, da Navios South American Logistics INC. (“Companhia”, “Emissora” ou “Navios”), analisado concomitantemente ao pedido de registro da oferta pública de distribuição inicial primária e secundária, de BDR Patrocinado Nível III ("BDRs") representativos de ações de emissão da Navios, tendo como instituição intermediária líder o Bank of America Merrill Lynch Banco Múltiplo S.A. ("Coordenador Líder").

Por meio do Ofício-Conjunto, a SEP e a SRE comunicaram à Companhia e ao Coordenador Líder a não abertura do prazo de análise em função de (i) no caso da SEP, quanto ao pedido de registro de emissor estrangeiro categoria A, por dúvidas em relação ao enquadramento da emissora ao Anexo 32-I da Instrução CVM nº 480/09 e por considerar que os dispositivos societários da Navios traziam riscos excessivos à poupança popular que seria captada na operação; e (ii) no caso da SRE, em relação ao pedido de registro de oferta pública de distribuição, por não ter sido cumprido o requisito do art. 4º, §1º, da Instrução CVM nº 332/00 ("Instrução CVM nº 332"), uma vez que os esforços de distribuição por meio da combinação do Regulation S e da Rule 144A não seriam aptos a preencher o requisito de distribuição simultânea no Brasil, nos termos da decisão do Colegiado proferida em 22.09.2020.

Ao receber a comunicação constante do Ofício-Conjunto, a Emissora estruturou uma nova oferta para a qual pediu à CVM que confirmasse se o modelo atenderia ao requisito disposto no art. 4º, §1º, da Instrução CVM nº 332, sendo tal assunto objeto de análise da SRE, ao passo que os aspectos relacionados ao registro de emissor foram analisados pela SEP.

A respeito da discricionariedade da SEP para indeferir pedidos de registro de emissores estrangeiros com regras societárias que além de conflitar com a legislação brasileira, permitiriam condutas que poderiam ser consideradas flagrantemente ilegais no Brasil, a SEP enviou o Memorando nº 96/2020-CVM/SEP/GEA-2 à Procuradoria Federal Especializada junto à CVM – PFE/CVM que, por meio do Parecer n. 00051/2020/GJU-2/PFE-CVM/PGF/AGU ("Parecer"), concluiu, em síntese, que:

"Pelo exposto, conclui-se que o deferimento do presente pedido de registro de emissor, tal como estruturado, tem o potencial de fragilizar o exercício da função regulatória e fiscalizatória da CVM, inclusive o cumprimento de um dos deveres definidos em seu mandato legal, qual seja, a proteção efetiva dos investidores residentes que atuem no mercado de valores mobiliários, alerta que ganha especial relevo se considerado que a oferta se destina a investidores não qualificados.

No mais, deverão ser sopesadas com (i) não aderência, pelos atos societários apresentados pela companhia, das práticas mínimas consideradas suficientes pelo Brasil em termos de supervisão e tratamento de irregularidades; (ii) a possibilidade de arbitragem regulatória, acentuada pelo fato de que a Companhia Emissora pontua que não se encontra regida por aparato legal e regulatório consistente no país de origem; (iii) a ausência de histórico de negociação de ações ou certificados de ações em nenhum mercado, bem como de supervisão da entidade reguladora de seu principal mercado de negociação; e (iv) o fato de que a CVM não terá garantia de pleno exercício de poder de polícia sobre emissor estrangeiro com essas características, sobretudo conforme se verifica no caso da consulente, cujas suas subsidiarias são incorporadas em várias jurisdições, e alguns dos administradores residem fora do Brasil, face às considerações formuladas nos itens precedentes.

Por consequência e considerando, ainda, a experiência anterior da CVM no caso paradigma citado ao início da presente manifestação, o deferimento do pedido de registro de emissor no caso concreto não parece encontrar suporte naquilo que dispõe o art. 4º, da Lei 6.385/76."

Tendo em vista sua discordância com a conclusão do Parecer, a Companhia apresentou os seguintes argumentos: (i) “está sedimentado o entendimento de que a Lei das Sociedades Anônimas não se aplica às companhias estrangeiras, conforme previsão do artigo 9º da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro”; e (ii) “que o fato de a Companhia não observar as práticas societárias brasileiras não seria um fundamento para não concessão de seu registro de emissora estrangeira”. Adiante na consulta, a Companhia apresentou uma lista de propostas voluntárias de alteração de seus documentos societários e, por fim, apresentou as seguintes conclusões: (i) por ser uma emissora estrangeira, a Companhia não estaria obrigada a observar as práticas societárias brasileiras; (ii) não obstante, a Companhia estaria sujeita à supervisão e fiscalização da CVM, bem como dos entes reguladores dos Estados Unidos (incluindo a Securities and Exchange Commission), das Ilhas Cayman e das Ilhas Marshall; (iii) a concessão do registro de emissor estrangeiro à Companhia não criaria barreiras adicionais à fiscalização e atuação do poder de polícia da CVM; e (iv) foram feitos ajustes espontâneos dos documentos societários da Companhia de forma a enfrentar os pontos levantados pela SEP bem como outros pontos de governança corporativa, visando a maior proteção do investidor.

Com base no exposto, a Navios requereu que: (i) seja proferido o entendimento de que as disposições societárias da Companhia não constituiriam nenhum impedimento para a concessão de registro de emissor estrangeiro; (ii) seja confirmado o entendimento de que a Companhia está apta a ter seu pedido de registro de emissor estrangeiro analisado pela CVM; e (iii) seja confirmado que a oferta nas Ilhas Cayman é suficiente para o cumprimento do artigo 4º da Instrução CVM nº 332. Os itens "i" e "ii", retro, foram examinados pela SEP, enquanto o item "iii" foi tratado pela SRE.

Em análise consubstanciada no Memorando nº 126/2020-CVM/SEP/GEA-2, a SEP destacou, incialmente, que apesar de as alterações promovidas na nova documentação proposta pela Companhia terem tratado de grande parte das preocupações a respeito dos riscos que os atos societários e os acordos de acionistas traziam para o investidor, permaneceram questões referentes inclusive à operacionalidade da custódia fungível das ações, de modo que não seria possível, naquele momento, apresentar uma análise exaustiva sobre a consistência do estatuto, do acordo de acionistas e dos atos societários de forma a afastar, nas palavras da PFE/CVM, a “não aderência, pelo atos societários apresentados pela companhia, das práticas mínimas consideradas suficientes pelo Brasil em termos de supervisão e tratamento de irregularidades”. Nesse contexto, a abordagem da SEP acerca da consulta da Companhia se concentrou na autonomia da CVM para, diante de evidências de documentos societários em flagrante contraste com princípios básicos e fundamentais para a proteção ao investidor e ao ordenamento jurídico brasileiro, indeferir o pedido de registro de emissor estrangeiro.

Assim, a SEP entendeu que, embora seja cediço que a Lei nº 6.404/76 não se aplica aos emissores estrangeiros, seria necessário reconhecer que emissores estrangeiros que apresentam disposições societárias em flagrante contraste com princípios básicos e fundamentais para a proteção ao investidor, não podem ser registrados e admitidos tendo como mercado principal de negociação o Brasil, e discordou da assertiva da Navios de que “disposições societárias da Companhia não constituiriam nenhum impedimento para a concessão de registro de emissor estrangeiro". Quanto à requisição de que “seja confirmado o entendimento de que a Companhia está apta a ter seu pedido de registro de emissor estrangeiro analisado por esta D. Comissão", a SEP afirmou não haver óbices, caso a documentação seja reapresentada com a incorporação das alterações propostas nos atos societários.

Com relação à requisição de que seja "seja confirmado que a Oferta nas Ilhas Cayman a ser realizada nos termos descritos acima sejam suficientes para o cumprimento do artigo 4º da Instrução CVM nº 332", a SRE, por meio do Memorando nº 121/2020-CVM/SRE/GER-2, após trazer um breve histórico e relembrar os contornos do precedente relacionado à oferta pública de BDRs da Aura Minerals Inc. (Reunião do Colegiado de 22.09.2020), afirmou que, em seu entendimento, a oferta a ser realizada nas Ilhas Cayman não atenderia ao requisito previsto no art. 4º, § 1º da Instrução CVM nº 332, uma vez que, analisado todo o contexto em que se propõe a sua realização e as características do mercado em questão, tal oferta não representaria uma distribuição de valores mobiliários no exterior à luz da regulamentação brasileira e tampouco asseguraria "uma maior proteção ao investidor desses certificados de depósito" não oferecendo, dessa forma, a segurança que se almejou com tal exigência.

Segundo a SRE, a leitura das informações constantes do documento intitulado Cayman Island Regulatory Memorandum, apresentado pela Companhia na versão traduzida para o português, em que são tecidas considerações acerca da regulamentação aplicável a ofertas naquela jurisdição, contém referência única e exclusivamente ao procedimento de listagem estabelecido pela bolsa do referido país, a Cayman Islands Stock Exchange ("CSX"), de modo que para realizar uma oferta pública nas Ilhas Cayman somente seria necessária a admissão à listagem na CSX e o cumprimento das regras de listagem da referida bolsa, não sendo mencionada nenhuma exigência ou processo a ser conduzido por um órgão regulador independente como ocorre no Brasil.

Na visão da SRE, tal situação em nada se compara com o caso analisado da oferta pública de BDRs da Aura Minerals Inc. (Reunião do Colegiado de 22.09.2020), posto que naquele caso, tratava-se de uma companhia que se encontrava sob a jurisdição do órgão regulador do mercado de capitais em seu país de listagem (a Ontario Securities Commission) pelo menos desde 1997, data mais antiga em que se identifica submissão de documentos àquele órgão regulador, possuindo, portanto, extenso histórico de supervisão enquanto Reporting Company sob a jurisdição de Ontario, podendo se concluir que “foi com base nesse histórico que o regulador do Canadá permitiu à emissora realizar o que seria uma oferta pública à luz da lei brasileira sem submissão de prospecto porque já havia sido realizado um escrutínio inicial anterior e uma grande quantidade de informações já havia sido prestada quando da oferta inicial e continuava sendo prestada regularmente em razão das obrigações de prestação de informações periódicas, modelo que guarda semelhanças com o brasileiro. (...)”, diferentemente de Cayman, “(...) que demonstra adotar um sistema de listagem direta em bolsa de valores com a possibilidade indiscriminada de esforços de venda dos valores mobiliários, o que não seria permitido à luz do arcabouço jurídico brasileiro, em que se exige a submissão da emissão e distribuição à disciplina de um órgão regulador”. Desse modo, não se poderia considerar que uma distribuição de valores mobiliários emitidos em jurisdição que possui modelo distinto do brasileiro, em que se delega integralmente à bolsa poderes para fiscalizar, normatizar e desenvolver o mercado de capitais, pudesse ser equiparada a uma oferta pública de distribuição no mercado de valores mobiliários brasileiro.

Diante do exposto, a SRE manifestou-se no sentido de que a oferta a ser realizada pela Emissora na Cayman Islands Stock Exchange nas Ilhas Cayman não estaria apta a cumprir o requisito previsto no art. 4º, § 1º da Instrução CVM 332.

O Colegiado decidiu, por maioria, que não obstante a Lei 6.404/76 não ser aplicável ao caso concreto por se tratar de emissor estrangeiro, sujeito portanto à legislação societária de seu país de origem, a análise da concessão de registro deveria pautar-se pelo poder-dever da CVM de proteção geral aos investidores do mercado de capitais brasileiro e de garantia do funcionamento regular e eficiente do mercado, na forma do art. 4º, da Lei 6.385/76, nesse aspecto em linha com as manifestações da SEP e da PFE/CVM no processo.

No entendimento do Colegiado, os deveres impostos pela Lei 6.385/76 à CVM não se restringem, de forma inflexível, à mera garantia aos investidores quanto ao acesso à informação, pois atribuem e impõem à Autarquia também a obrigação de proteger investidores e assegurar a observância de práticas equitativas no mercado de valores mobiliários.

Dessa forma, o Colegiado entendeu que a Lei 6.385/76 autoriza a área técnica a considerar, em sentido mais amplo, as regras de proteção oferecidas ao investidor, podendo examinar, diante de um pedido de registro de emissor estrangeiro, se existem elementos mínimos que assegurem a sua proteção, notadamente sobre disposições que estejam em flagrante contraste com os princípios e as diretrizes que orientam o cuidado aos direitos dos investidores e o regular funcionamento do mercado de capitais e a sua idoneidade. Não se trata, portanto, de dar aplicação indevida à lei societária brasileira, mas de exercer um juízo de compatibilidade entre o direito societário aplicável ao emissor e aquele existente no Brasil para verificação da existência de garantias essenciais.

Quanto ao pedido de registro de oferta pública, o Colegiado, por maioria, acompanhou as conclusões da SRE, no sentido de que a oferta a ser realizada pela Consulente na Cayman Islands Stock Exchange nas Ilhas Cayman não é apta a cumprir o requisito previsto no art. 4º, § 1º, da Instrução CVM 332.

O Diretor Alexandre Rangel, por sua vez, apresentou voto divergindo da maioria do Colegiado. Especificamente sobre os três pontos levantados no caso concreto, Rangel entendeu que (i) a legislação brasileira e as normas aplicáveis, atualmente, não autorizam a CVM a emitir juízo de valor sobre disposições societárias internas da Companhia para fins de registro como emissor estrangeiro; (ii) no pedido de registro de emissor estrangeiro aqui tratado, estão atendidos os requisitos exigidos pela Instrução CVM n° 332/00, com as alterações promovidas pela Resolução CVM n° 3/20; e (iii) a oferta no exterior mencionada pela Companhia observa a exigência prevista no art. 4° da Instrução CVM n° 332/00, combinado com o art. 2° do mesmo normativo.

Sobre o item (i) acima, em atenção ao princípio da legalidade, o Diretor entendeu que não integra a esfera de competência da CVM o poder-dever de propor ajustes ao conteúdo jurídico de regras societárias de emissores estrangeiros no âmbito da análise do respectivo pedido de registro. Assentada a premissa unânime de que a Lei 6.404/76 não se aplica a emissores estrangeiros, não pareceu razoável ao Diretor que a lei do anonimato seja utilizada como parâmetro ou referência de regra a ser exigida, em maior ou menor grau, do emissor estrangeiro em seus documentos societários.

Qualquer opinião minimamente embasada sobre tais questões demandaria, obviamente, conhecimentos técnicos e específicos sobre legislação estrangeira, um regime jurídico e regulatório diferente do brasileiro, seguramente com diversas e desconhecidas outras implicações, o que não seria papel do regulador do mercado de capitais brasileiro.

Ressaltou, no caso concreto, que o emissor apresentou de forma transparente diversos fatores de risco e pontos de atenção que devem ser levados em consideração, em observância ao regime informacional, um dos mais importantes pilares de atuação da CVM. De qualquer modo, o Diretor pontuou que o emissor implementou, voluntariamente, alterações em dispositivos societários que, no entendimento da área técnica, parecem ter equacionado algumas das preocupações inicialmente apresentadas ao emissor.

Quanto ao item (ii), Rangel fez menção à decisão unânime do Colegiado, proferida em 29.09.2020, no sentido de que não existe a obrigação de que o principal mercado de negociação do emissor estrangeiro esteja localizado no exterior, podendo ser o Brasil o referido principal mercado. Nesse sentido, lembrou que um dos objetivos centrais da reforma promovida pela Resolução CVM n° 3/20 foi justamente, nas palavras da SDM, cobrir a situação em que “emissores que não sejam capazes de realizar uma oferta em outros mercados – inclusive por não contarem com mercados de capitais desenvolvidos em seus países de origem – o mercado de capitais brasileiro deixaria de ser uma alternativa, em potencial prejuízo aos emissores estrangeiros e aos participantes do mercado brasileiro”. Por essa razão, na opinião do Diretor, não deve causar estranheza o grau de maturidade ou de desenvolvimento do “aparato jurídico societário” do mercado da sede do emissor.

Sem prejuízo de eventuais aprimoramentos nas normas aplicáveis, observou que os núcleos de responsabilidade dos emissores estrangeiros, hoje, estão previstos na Instrução CVM n° 480/09. Lembrou que o emissor estrangeiro, seus diretores e membros do Conselho de Administração têm a obrigação de “designar representantes legais domiciliados e residentes no Brasil, com poderes para receber citações, notificações e intimações relativas a ações propostas contra o emissor no Brasil ou com fundamento em leis ou regulamentos brasileiros, bem como para representá-los amplamente perante a CVM, podendo receber correspondências, intimações, notificações e pedidos de esclarecimento” (art. 3° do Anexo 32-I da Instrução CVM n° 480/09). A instituição depositária, localizada e devidamente habilitada no Brasil, também desempenha papel fundamental, pois tem o dever de monitorar as informações prestadas pelo emissor estrangeiro, auxiliar a CVM na obtenção de informações e ser ativa e diligente na preservação dos interesses dos detentores dos BDRs (art. 4° do Anexo 32-I da Instrução CVM n° 480/09).

Com relação ao item (iii), o Diretor pontuou que o art. 4°, §1°, da Instrução CVM n° 332/00 dispõe que “[s]omente será registrado o programa de BDR Nível III quando for concomitante o registro de oferta pública de distribuição de BDR e simultânea a distribuição dos valores mobiliários no Brasil e no exterior”. Além disso, o art. 2° da Instrução CVM n° 332/00 enuncia que “[s]omente serão aceitos valores mobiliários de emissão de companhias abertas, ou assemelhadas, que sejam admitidos à negociação e custodiados em países cujos órgãos reguladores tenham celebrado com a CVM acordo de cooperação sobre consulta, assistência técnica e assistência mútua para a troca de informações, ou sejam signatários do memorando multilateral de entendimento da Organização Internacional das Comissões de Valores – OICVA”.

Segundo informado pela Companhia, a distribuição simultânea no exterior ocorrerá nas Ilhas Cayman, jurisdição que atende a integralidade dos requisitos dos dispositivos transcritos acima. Esclareceu o Diretor que a autoridade local é signatária desde 2009 tanto de acordo de cooperação com a CVM quanto do memorando multilateral de entendimento da IOSCO. Muito embora sejam requisitos alternativos, observou que no caso concreto ambas as exigências estão atendidas.

Segundo Rangel, a discussão neste terceiro e último tópico consiste em avaliar se uma opinião eventualmente crítica sobre o regime regulatório existente na jurisdição escolhida pelo emissor para realizar a oferta simultânea no exterior – mesmo que a localidade atenda na íntegra os requisitos objetivos que atualmente estão previstos na Instrução CVM n° 332/00 – seria um impeditivo ao prosseguimento dos trâmites de registro de um emissor estrangeiro no Brasil. De acordo com as normas vigentes, o Diretor não vislumbrou base jurídica ou regulatória para impedir o registro de emissor estrangeiro por esse motivo. Qualquer arcabouço regulatório estrangeiro será sempre diferente do brasileiro. Estruturas de órgãos mais ou menos flexíveis, regimes de supervisão mais ou menos prudenciais, abordagens regulatórias com uma preocupação mais ou menos sistêmica são uma realidade em várias localidades. Toda jurisdição terá invariavelmente as suas peculiaridades e é saudável que assim o seja.

Assegurado o full and fair disclosure, cabe ao investidor avaliar o risco e o mérito da oportunidade de investimento do valor mobiliário a ser emitido pelo emissor estrangeiro no Brasil. O cerne da questão para o regulador consiste em avaliar se os requisitos expressamente exigidos nas normas atuais estão atendidos.

Como conclusão, voltando ao caso concreto, Rangel registrou seu entendimento no sentido de que a oferta no exterior descrita pelo emissor está de acordo com o art. 4° da Instrução CVM n° 332/00, estando atendidas as exigências estabelecidas no art. 2° da mesma norma.

Sendo assim, por maioria, vencido o Diretor Alexandre Rangel, o Colegiado acompanhou a conclusão da SEP e da SRE pelo cabimento, no caso, do indeferimento dos respectivos registros, acolhendo em parte os fundamentos apresentados pelas áreas técnicas.

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