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Decisão do colegiado de 23/09/2014

Participantes

LEONARDO PORCIUNCULA GOMES PEREIRA - PRESIDENTE
ANA DOLORES MOURA CARNEIRO DE NOVAES - DIRETORA
LUCIANA PIRES DIAS - DIRETORA*
ROBERTO TADEU ANTUNES FERNANDES - DIRETOR

* Por estar em São Paulo participou por videoconferência.

PEDIDO DE DISPENSA DE REQUISITO NORMATIVO - INSTRUÇÃO CVM 356/2001 - CITIBANK DTVM S.A. – PROC. RJ2013/11017

Reg. nº 9284/14
Relator: SIN/GIE

Trata-se de apreciação de pedido de dispensa de requisitos da Instrução CVM 356/2001 (“Instrução CVM 356”), com alterações introduzidas pela Instrução CVM 531/2013 (“Instrução CVM 531”), apresentado pelo Citibank DTVM S.A. (“Custodiante” ou “Administradora”), na qualidade de administradora, gestora e custodiante do BB Recuperação de Crédito Banco do Brasil FIDC NP (“Fundo”).

Em seu pedido, a Administradora esclarece que o Fundo tem como objetivo adquirir direitos creditórios inadimplidos do Banco do Brasil S.A. (“Cedente”) que estejam em cobrança administrativa ou judicial e que tenham sido originados no âmbito da rede de agências bancárias da Instituição. A distribuição de cotas do Fundo se dará nos termos da Instrução CVM 476/2009.

O pedido principal refere-se à dispensa do cumprimento do disposto no art. 38, V, e §7º, II da Instrução CVM 356, de forma a permitir que o Cedente efetue a guarda dos documentos comprobatórios dos direitos creditórios, mantidos nas suas diversas agências bancárias. Adicionalmente, a Administradora solicita dispensa do cumprimento do art. 38, VII, alíneas “a” e “b”, da Instrução CVM 356, com vistas a permitir o recebimento dos pagamentos dos direitos creditórios em conta corrente do Cedente, para os créditos que o Fundo venha a adquirir e que já estejam com processo judicial de cobrança em curso.

Preliminarmente, a Superintendência de Relações com Investidores Institucionais (“SIN”) ressaltou que a dispensa ao cumprimento do art. 38, §7º, II, da Instrução CVM 356 guarda semelhanças com as dispensas já concedidas pelo Colegiado, em reunião de 15.07.14, para dois FIDCs administrados pela BRL Trust e um FIDC administrado pela Gradual, no âmbito do Processo RJ2013/4911, no qual o voto vencedor da Diretora Ana Novaes acompanhou a decisão da área técnica, bem como os condicionantes dispostos no MEMO/CVM/SIN/GIE/Nº 215/2013.

A SIN, após analisar o presente caso, e nos termos da decisão do Colegiado de 15.07.14, manifestou-se favorável a dispensa ao cumprimento do disposto no art. 38, §7º, II, da Instrução CVM 356, com redação dada pela Instrução 531, de forma a permitir que o Cedente do Fundo efetue a guarda dos documentos comprobatórios, desde que atendidas, cumulativamente, às seguintes exigências:

(i) Prévia aprovação pela unanimidade dos cotistas, reunidos em assembleia geral, independentemente de qualquer ciência por meio de termo de adesão, aliado ao compromisso do administrador em adotar procedimentos que assegurem, na hipótese de ocorrer transferência de cotas, que o adquirente será previamente cientificado sobre a dispensa do cumprimento do art. 38, §7º, II, da Instrução CVM 356;

(ii) Todos os contratos de cessão de direitos creditórios devem possuir cláusulas que prevejam a recompra ou indenização pelo Cedente, no mínimo, pelo valor de aquisição pago pelo Fundo (corrigidos, quando for o caso), na hipótese de o cedente não conseguir apresentar os documentos que comprovem a existência do crédito, ou erros na documentação que inviabilizem a cobrança do crédito cedido;

(iii) O Regulamento não pode prever a dispensa de que trata o art. 38, §3º, da Instrução CVM 356, de forma que o lastro dos direitos creditórios seja verificado pelo Custodiante, nos termos do art. 38, §1º, da mesma Instrução; e

(iv) Os Informes Trimestrais do Fundo, estabelecidos no art. 8º, §3º da Instrução CVM 356, que trata da análise e da divulgação de informações sobre a qualidade da carteira, bem como os eventos extraordinários ocorridos no trimestre, devem divulgar a exposição do FIDC a cada um do(s) cedente(s), similar ao que hoje ocorre no Informe Mensal de FIDC no que se refere a direitos creditórios adquiridos sem aquisição substancial de riscos e benefícios, divulgando ainda, o montante de créditos recomprados ou indenizados conforme o estabelecido no item (ii) acima.

No que se refere aos controles mantidos pelo Custodiante, a área técnica alertou que este já deve possuir mecanismos que lhe deem efetivo controle sobre os recebíveis que compõem a carteira do Fundo, a fim de exercerem minimamente o seu papel, notadamente os serviços de cobrança e recebimento de recursos.

A SIN reforçou que, não obstante seu entendimento favorável em relação ao pleito, todas as demais atribuições do Custodiante restam preservadas, nos termos do art. 38 da Instrução CVM 356, assim como a concessão da dispensa não configura uma isenção de responsabilidade por parte do Custodiante, inclusive em relação à própria guarda da documentação relativa aos direitos creditórios. Desta forma, a área técnica manifestou-se contrária ao acatamento do pedido de dispensa do art. 38, V, da Instrução CVM 356, a fim de preservar a responsabilidade do Custodiante em relação à guarda dos documentos de que trata tal dispositivo.

A SIN lembrou ainda que a permissão da contratação de prestadores de serviço para a guarda da documentação, de que trata o art. 38, da Instrução CVM 356, nos termos do §6º do mesmo artigo, não isenta o Custodiante de sua responsabilidade primária em relação à matéria, e nem foi objeto de dispensa no âmbito do Processo CVM RJ2013/4911, permanecendo inalteradas as responsabilidades deste participante, apesar da permissão concedida em relação à guarda dos créditos pelo cedente.

Adicionalmente, em relação à questão levantada pela Administradora de que em casos de cobrança judicial, onde os documentos comprobatórios dos direitos creditórios fazem parte dos autos da própria ação, o Custodiante estaria impossibilitado de manter a sua guarda, a SIN entende que tal situação não carece de dispensa formal pelo Colegiado, dado que, nesta hipótese, tais documentos, obrigatoriamente, devem permanecer nos autos do processo de cobrança, o que representa uma inexigibilidade de conduta diversa por parte do regulado.

Já com referência ao pedido de dispensa do cumprimento do art. 38, inc. VII, da Instrução CVM 356, solicitando que os recursos provenientes dos pagamentos dos direitos creditórios que já estejam em processo de cobrança judicial no momento de sua aquisição pelo Fundo sejam depositados diretamente na conta corrente do cedente, a SIN avalia que a Administradora deve solicitar nos autos dos processos judiciais a mudança da titularidade da referida conta para a do Fundo. Também nessa hipótese, caso este pleito seja negado pelo juiz, se estaria diante de outra situação onde há inexigibilidade de conduta diversa por parte do regulado, não carecendo, portanto, de dispensa formal pelo Colegiado.

A Diretora Luciana Dias, que havia pedido vista do processo em reunião de 16.09.14, esclareceu que, apesar de concordar com o posicionamento da SIN em relação aos pedidos apresentados pela Administradora quanto à guarda dos documentos que comprovam direitos creditórios objeto de disputa judicial, quanto ao pagamento desses direitos em conta corrente do cedente e quanto à responsabilidade do Custodiante, não concorda com o entendimento manifestado em relação à possibilidade de guarda, pelos cedentes, dos documentos comprobatórios de créditos adquiridos por um FIDC, pelas razões já expostas em voto proferido no âmbito do Processo CVM RJ2013/4911.

Além dos argumentos já expostos em referida oportunidade, a Diretora Luciana Dias acrescentou que os precedentes em que o Colegiado permitiu que a guarda física dos documentos relativos aos direitos creditórios cedidos a um FIDC permanecesse com o originador (Processos CVM RJ2012/1961 e RJ2013/4911) tratavam de casos distintos do caso em análise. No primeiro deles, anterior à Instrução CVM 531, tratava-se de um fundo cujas cotas seriam adquiridas por um único cotista, controlador do originador dos créditos a serem cedidos para o FIDC e havia uma vedação para negociação das cotas do fundo no mercado secundário. No entendimento da Diretora, portanto, não havia realmente terceiros a serem protegidos ou um risco à imagem da indústria de FIDC.

No segundo deles, em que ficou vencida a Diretora Luciana, a decisão tomada por maioria pelo Colegiado teria sido baseada no art. 9º da Instrução CVM 444/2006 (“Instrução CVM 444”) e, em especial, em manifestação da então presidente Maria Helena Santana no âmbito do Processo CVM RJ2011/12448, decidido em 20.03.12 e, portanto, anteriormente à Instrução CVM 531. Porém, apesar de concordar com a colocação da então presidente da CVM, a Diretora Luciana entende que tal colocação se referia à situação distinta da ora analisada. No âmbito do Processo CVM RJ2011/12448, os comandos objeto de dispensa (arts. 40-A e 36, inciso III, Instrução CVM 356, respectivamente) diziam respeito a mitigações de risco de contraparte e riscos relacionados à variação do câmbio e às dificuldades operacionais de cobrança no exterior. Já no presente caso, o dispositivo que se pleiteia a dispensa visa endereçar risco de fraude, que no entendimento da Diretora justifica análise com maior rigor.

A Diretora Luciana Dias também acrescenta que dentre as principais missões da CVM, estabelecidas no art. 4º da Lei 6.385/76, estão a proteção ao investidor e o funcionamento regular e eficiente do mercado, mas não o desenvolvimento do mercado de recuperação de crédito. Para a Diretora, a CVM pode e deve contribuir para o desenvolvimento de outras áreas no mercado financeiro. No entanto, tal contribuição não pode implicar na renuncia às suas missões institucionais. Assim, sob a perspectiva da CVM, o desenvolvimento do mercado de recuperação de crédito não deveria se sobrepor às suas missões institucionais previstas em lei. Tendo em vista que as salvaguardas das quais se pede dispensa dizem respeito ao regular funcionamento do mercado e à proteção do investidor, a Diretora entende que as dispensas não devem ser concedidas.

Assim, a Diretora Luciana Dias votou pelo indeferimento do pedido de dispensa formulado pela Administradora quanto ao cumprimento do art. 38, V, bem como do art. 38, §7º, II da Instrução CVM 356.

A Diretora Ana Novaes reforçou a posição já consignada na reunião no dia 15.07.14, destacando que, no seu entendimento, as particularidades dos precedentes em nada alteram as referências que pontuam as diferenças entre os FIDC-NP dos FIDCs regulados apenas pela Instrução CVM 356.

A Diretora Ana Novaes destacou ainda que o voto condutor da então Presidente Maria Helena Santana, em um dos precedentes mencionados pela Diretora Luciana Dias (Processo CVM RJ2022/12448), não restringiu a concessão de dispensa de que trata o art. 9º da Instrução CVM 444 às particularidades do caso de que se tratava (fundo exclusivo e com vedação para negociação de cotas no mercado secundário), tendo destacado a importância de se privilegiar o interesse público e a proteção do investidor. No entendimento da Diretora Ana Novaes, estes valores foram corretamente valorados no presente processo e no Processo CVM RJ2013/4911.

Nesse sentido, a Diretora lembrou que a Instrução CVM 444, que regula especificamente os FIDC-NP, prevê expressamente em seu art. 1º, §1º, incisos I e IV, que referidos veículos podem investir, em quaisquer percentuais de seu patrimônio, em direitos creditórios ”que estejam vencidos e pendentes de pagamento quando de sua cessão para o fundo” e “cuja constituição ou validade jurídica da cessão para o FIDC seja considerada um fator preponderante de risco”. Ou seja, diferentemente dos FIDC “Padronizados”, que tratam de créditos em seu curso normal de recebimento, é característica inerente aos FIDC-NP o investimento em direitos creditórios com características específicas, dentre eles, direitos creditórios inadimplidos e cuja constituição ou validade jurídica constituam fator preponderante de risco.

Por esses motivos, a Diretora Ana Novaes entende que as características específicas do caso concreto autorizam a concessão da dispensa sem ameaçar a credibilidade da indústria de fundos que aplicam em direitos creditórios e os avanços conquistados com a edição da Instrução CVM 531.

O Colegiado decidiu, por maioria, nos termos do Memorando da SIN e da manifestação da Diretora Ana Novaes, deferir o pedido de dispensa do cumprimento do art. 38, § 7º, II, da Instrução CVM 356, e, por unanimidade, indeferir o pedido de dispensa do cumprimento do art. 38, inciso V da Instrução CVM 356, nos termos do Memorando da SIN, acompanhando também a área técnica em relação à desnecessidade de dispensa formal ao disposto no art. 38, VII, da Instrução.

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