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Decisão do colegiado de 28/01/2014

Participantes

ANA DOLORES MOURA CARNEIRO DE NOVAES - PRESIDENTE EM EXERCÍCIO
LUCIANA PIRES DIAS - DIRETORA
ROBERTO TADEU ANTUNES FERNANDES - DIRETOR

RECURSO CONTRA DECISÃO DA SEP - REGISTRO INICIAL DE EMISSOR DE VALORES MOBILIÁRIOS – AZUL S.A. – PROC. RJ2013/5993

Reg. nº 8923/13
Relator: SEP (PEDIDO DE VISTA DAN)

Trata-se de recurso interposto pela Azul S.A. ("Azul" ou "Companhia") contra decisão da Superintendência de Relações com Empresas – SEP que indeferiu o Pedido de Registro Inicial de Companhia Aberta – Categoria "A" apresentado pela Companhia. O Colegiado iniciou o exame do assunto na reunião de 19.11.2013, tendo a Diretora Ana Novaes naquela oportunidade solicitado vista do processo.

O estatuto social da Azul atribui às ações preferenciais as seguintes preferências e vantagens: (i) prioridade no reembolso de capital; (ii) direito de serem incluídas em oferta pública de aquisição de ações em decorrência de alienação de controle da companhia nas mesmas condições e ao preço por ação equivalente a 75 (setenta e cinco) vezes o preço por ação pago ao acionista controlador alienante; (iii) direito ao recebimento de valores equivalentes a 75 (setenta e cinco) vezes o valor atribuído às ações ordinárias, em caso de liquidação da companhia, quando da divisão dos ativos remanescentes entre os acionistas; e (iv) direito ao recebimento de dividendos iguais a 75 (setenta e cinco) vezes o valor pago a cada ação ordinária. Adicionalmente, o estatuto prevê que as ações ordinárias são conversíveis em ações preferenciais na proporção de 75 (setenta e cinco) ações ordinárias para cada ação preferencial.

A SEP indeferiu o pedido de registro de companhia aberta apresentado pela Azul por entender que as vantagens atribuídas às ações preferenciais estariam em desacordo com o disposto no art.15, § 2º da Lei nº 6.404/1976. Para a área técnica, nos termos dos Relatórios de Análise nº 111, de 15.10.2013 e nº131, de 12.11.2013, o referido dispositivo não trataria somente de uma proporção em termos de quantidade de ações, mas também de uma proporção em termos de aporte econômico. Consequentemente na visão da SEP, o poder político deveria guardar proporcionalidade com o volume de recursos aplicado no negócio, fato que não estaria sendo previsto no estatuto da Companhia.

A SEP acrescentou que a atribuição de um dividendo às ações preferenciais 75 vezes maior que o atribuído às ações ordinárias não constitui vantagem econômica em essência, uma vez que ele tão somente reflete a proporcionalidade de 75:1 em termos patrimoniais que foi estabelecida no estatuto Social da Companhia. A SEP registrou, ainda, que as limitações impostas pelo Código Brasileiro de Aviação não poderiam justificar a não observância da legislação societária.

Instada a se manifestar, a Procuradoria Federal Especializada junto à CVM – PFE apresentou, nos termos do Parecer/nº009/2013/PFE-CVM/PGF/AGU, de 17.12.2013, manifestação opinando pela impossibilidade jurídica do modelo proposto pela Azul e pela manutenção da decisão da SEP. Para a PFE, uma interpretação histórica do art.15, § 2º da Lei nº 6.404/1976, demonstra que o critério para a fixação do limite de emissão de ações preferenciais sempre teve como premissa a relação existente entre participação no capital social e poder político do acionista. A interpretação literal desse dispositivo, como proposto pela Companhia, acabaria, no entendimento da PFE, por subtrair sua função no ordenamento jurídico.

A PFE ressalta, ainda, o caráter cogente da norma prevista no art.15, § 2º da Lei nº 6.404/1976, essencial para a manutenção do equilíbrio do "sistema jurídico da companhia", que não pode ser afastada ou mitigada pela vontade do particular.

A Diretora Ana Novaes apresentou voto discordando do posicionamento da área técnica e da PFE. Para a Diretora, a Lei nº 6.404/1976 passou a admitir a dissociação entre os interesses econômicos e políticos, ao permitir a emissão de ações sem valor nominal e estabelecer que o limite percentual para emissão de ações preferenciais não mais seria calculado com base no capital social, mas tendo por referência o total de ações da companhia.

Ainda segundo a Diretora, a reforma da Lei Societária em 2001 estabeleceu como uma das vantagens das ações preferenciais admitidas à negociação no mercado, um dividendo por ação pelo menos 10% maior do que aquele atribuído à ação ordinária. A Lei nº 6.404/1976 teria, portanto, estabelecido um valor mínimo para a preferência e não caberia a CVM estabelecer limites quando a lei não o fez. Ademais, embora a maioria dos dispositivos da Lei nº 6.404/1976 contenha normas cogentes, prevalece a liberdade de contratar no que diz respeito à repartição do resultado da atividade social entre os acionistas.

Prosseguiu a Diretora Ana Novaes, opinando que potencial desalinhamento de interesses entre o acionista controlador e os minoritários deve ser devidamente precificado pelo mercado, sem prejuízo da fiscalização exercida pela CVM para apurar eventuais descumprimentos de deveres por parte de controladores e administradores.

Com relação ao estatuto social da Azul, a Diretora Ana Novaes apontou que o estatuto da companhia apresentaria indícios de desconformidade com a Lei nº 6.404/1976 em dois aspectos. Em primeiro lugar, a redação das cláusulas referentes ao cálculo do dividendo poderia induzir os acionistas a erro e não estaria, por conseguinte, atendendo ao art. 202, § 1º, da Lei nº 6.404/1976 em combinação com o art. 19, por não estabelecer de forma clara e precisa o critério para determinação do dividendo a ser distribuído aos acionistas. Em segundo lugar, a Diretora entendeu que o estatuto da Azul não estaria estipulando com clareza a quantia que será prioritariamente distribuída às ações preferenciais em caso de reembolso, o que poderia não atender ao art. 17, II, da Lei nº 6.404/1976. Por fim, a Diretora Ana Novaes assinalou que o estatuto da Companhia prevê que, em caso de uma eventual oferta pública para cancelamento de registro de companhia aberta ou para saída de segmento, o preço a ser ofertado aos acionistas deverá corresponder ao valor econômico, sem deixar claro se a proporção de 75:1 se aplicaria nesses casos, embora não faça muito sentido lógico ou sistemático que na avaliação do valor das ações, o avaliador não leve em consideração as vantagens econômicas da ação preferencial no caso concreto.

Pelas razões acima resumidas, a Diretora Ana Novaes votou pela legalidade do art. 5º do estatuto social da Azul, dando provimento ao recurso da Companhia. Ademais, a Diretora Ana Novaes recomendou que a SEP, ao dar prosseguimento em sua análise do pedido de registro de companhia aberta à AZUL avalie, com a devida concessão à Companhia do direito de se manifestar, (i) se o art. 35 da minuta do estatuto da Companhia atende o art. 202 , § 1º, combinado com o art. 19, ambos da Lei nº 6.404, de 1976, descrevendo com precisão e minúcia a forma do pagamento do dividendo; e (ii) se o art. 5º, parágrafo 10º da minuta de estatuto confere a prioridade prevista nos termos do art. 17, II, da Lei nº 6.404, de 1976.

Na sequência, a Diretora Luciana Dias solicitou vista dos autos.

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