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Decisão do colegiado de 18/06/2002

Participantes

JOSÉ LUIZ OSORIO DE ALMEIDA FILHO - PRESIDENTE
LUIZ ANTONIO DE SAMPAIO CAMPOS - DIRETOR
NORMA JONSSEN PARENTE - DIRETORA
WLADIMIR CASTELO BRANCO CASTRO - DIRETOR

RECURSO EM PROCESSO DE FUNDO DE GARANTIA - CLUBE DE INVESTIMENTOS P/L / MARLIN S/A CCTVM - PROC. SP2002/0011

Reg. nº 3642/02
Relator: DWB
O Colegiado acompanhou o voto do Diretor-Relator, abaixo transcrito:
PROCESSO CVM SP2002/0011 – REGISTRO EXE/CGP nº3642/2002
RECURSO DE DECISÃO DE FUNDO DE GARANTIA ("Caso Marlin")
Reclamante: Clube de Investimentos P/L
Relator: Diretor Wladimir Castelo Branco Castro
Relatório
Trata-se de recurso de decisão da BVRJ (fls.164 Processo FG/BVRJ nº 0181/2001 – "Processo FG") proferida em razão de reclamação ao Fundo de Garantia interposta por Paulo Roberto Guimarães Monteiro de Barros, representante legal do Clube de Investimentos P/L(fls.03 Processo FG).
O Sr. Paulo Roberto Guimarães Monteiro de Barros, representante legal do Clube de Investimentos P/L (ficha cadastral e contrato à fls.14 do Processo FG), em 26/01/2001 apresentou reclamação ao Fundo de Garantia da Bovespa, requerendo a reposição de 1.100 ações PNA de emissão da Cia. Vale do Rio Doce "alegando que tais ações estão faltando em sua posição de custódia, junto à Corretora Marlin, ex-administradora do clube", de acordo com o Relatório de Auditoria da Bovespa (fls.09 do Processo FG).
Em documento enviado à Bovespa em 26/04/2001, o Reclamante informa que "não recebemos extratos da CBLC/CLC, independentemente deles haverem sido emitidos ou não. Adicionalmente, ressaltamos que, por ocasião de nosso cadastramento como cliente da corretora Marlin, não nos foi exigida por qualquer órgão fiscalizador, seja a CBLC ou a CLC, a obrigação de conferência de extratos enviados pelo correio, relativos às nossas operações de compra e venda de ações ... tomamos conhecimento da falta das 1.100 ações de emissão da Cia. Vale do Rio Doce no dia 11 de janeiro de 2001" (fls.56 do Processo FG).
A Consultoria de Auditoria da Bovespa, após os levantamentos necessários, concluiu, em síntese, que "durante o período de 31/07/96 a 22/12/98, 1.350 ações VALE PNA foram transferidas indevidamente da conta de custódia do Reclamante na CLC e em 06/09/96 e 03/02/97 a conta do Reclamante recebeu um crédito de ações no total de 250 ações VALE PNA" (fls.60 do Processo FG).
O Parecer da Consultoria Jurídica da Bovespa concluiu que "o Reclamante tem direito ao ressarcimento pelo Fundo de Garantia dos prejuízos ocasionados pelas transferências indevidas de sua conta de custódia mantida na CLC efetuadas entre31/07/96 e 22/12/98 que levaram a falta de 1.100 ações VALE PNA até o limite do valor equivalente a 150.000 (cento e cinqüenta mil) BTN’s, devido a aplicação do Inc. II combinado com o parágrafo único do art.41 do Regulamento anexo à Resolução CMN nº 1.656/89" (fls.65 Processo FG) e que "o Fundo de Garantia da BVRJ deve apreciar o pedido de ressarcimento de todos os prejuízos ocasionados por transferências irregulares de custódia originadas na CLC ou ocorridas no âmbito da CLC ... logo, os prejuízos ocasionados pelas transferências irregulares, ocorridas na CLC, que totalizam hoje 1.100 ações VALE PNA, acrescidas de todos os direitos a elas relativos, devem ser objeto de apreciação e eventual ressarcimento pelo Fundo de Garantia da BVRJ, observado o limite previsto na legislação aplicável" (fls.66 do Processo FG). O Conselho de Administração da Bovespa decidiu manter a decisão adotada pela Comissão especial de Fundo de Garantia que, por sua vez, seguiu o entendimento prolatado nos Pareceres da Consultoria Jurídica (fls. 68 e 69 do Processo FG).
Encaminhados os autos à BVRJ (cf. fls. 73 do Processo FG), a reclamação passou pela análise da Auditoria da BVRJ, que concluiu: "além da Corretora Marlin na condição de administradora do CLUBE, existe também o SR. PAULO ROBERTO GUIMARÃES DE BARROS, na condição de responsável pela administração da carteira e representante legal dos condôminos, junto à instituição administradora" (fls.81 Processo FG)."O SR. PAULO ROBERTO, como responsável pela administração e representante legal do CLUBE, detém conhecimento de seus deveres e das práticas de mercado e, assim, ao se omitir em conferir os extratos da Câmara de Liquidação e Custódia, pôde, procedendo como ele mesmo relata, contribuir para a ocorrência e permanência da falta das ações reclamadas na custódia do CLUBE por tanto tempo" (fls.85 Processo FG). O Parecer da BVRJ diz que "se os administradores da carteira do Reclamante jamais receberam extratos é porque jamais diligenciaram para tanto, sendo certo que, como o endereço constante do cadastro do Reclamante é exatamente o endereço da Reclamada, administradora do Reclamante, caberia aos administradores da carteira do Reclamante requererem a ela tais extratos. Ao que parece isso nunca foi feito, até porquê entende um dos administradores que nunca lhe foi exigida tal obrigação ... nos autos não há qualquer prova de que os administradores da carteira, representantes do Reclamante, diligenciaram junto à Reclamada relativamente às transferências ocorridas, constatando-se, contrariamente, confissão de um dos administradores quanto à sua inacreditável crença de inexistência de obrigação quanto à conferência dos extratos regularmente expedidos pela CLC, como se isso pudesse por si só configurar a procedência da reclamação" (fls.156 e 157 Processo FG).
Ao observar o mérito, o Parecer diz que "no mérito, o pedido de ressarcimento deve ser julgado improcedente, pois resta prejudicado por força da atuação dos administradores da carteira do Reclamante ... os administradores da carteira do Reclamante não agiram com a devida diligência, pois não atuaram em consonância com as disposições advindas do art. 15, § 3º c/c art. 14, inc. IV, da Instrução CVM nº40/1984, do seguinte teor: ‘Art. 15 – [...] § 3º - Ao administrador da carteira aplica-se o disposto no inciso IV do artigo 14. Art.14 – empregar na defesa dos interesses dos condôminos a diligência que todo homem ativo e probo costuma empregar na administração de seus próprios negócios’. Juntamente com os mencionados deveres, tenha-se em vista o disposto no art. 22, § 5º, do Estatuto do Reclamante, cuja redação estabelece ser da competência da administradora do Reclamante, ‘remeter, mensalmente através do administrador da carteira, aos condôminos informações relativas ao desempenho do clube, no mês anterior à composição da carteira, à posição patrimonial do Clube e de cada condômino em particular ... nos termos do documento intitulado ‘Relação de Quotistas por Ordem Alfabética’, às fls. 35, verifica-se que o Sr. Paulo Roberto Guimarães Monteiro de Barros, um dos administradores da carteira do Reclamante, além de representante legal, é condômino do Reclamante, detentor de mais de 99% de suas quotas" (fls. 160 e 161 do Processo FG).
Assim, o Parecer conclui que "deve-se considerar improcedente o pedido do Reclamante, por força da intempestividade de sua formulação, não sendo cabível, por conseguinte, a reposição, pelo fundo de Garantia da BVRJ, das 1.100 ações do tipo PNA, de emissão da CVRD" (fls. 162 do Processo FG). A Comissão Especial do Fundo de Garantia da BVRJ decidiu adotar na íntegra o Parecer supra citado. E o Conselho de Administração da BVRJ julgou improcedente a presente reclamação por considerá-la intempestiva (fls. 164 e 165 do Processo FG).
Em seu recurso, o Reclamante apresenta a seguinte questão: "quem recebia os extratos? Pelo que se apurou, o setor de custódia, de onde se originaram todas as irregularidades cometidas na corretora Marlin ... esse setor não levava ao clube esses extratos, pois ficariam evidenciadas as práticas irregulares que eram cometidas" (fls. 07 e 08). Adiante, afirma: "a verdade é que os extratos não chegaram ao Clube, ou seja, não foram recebidos pelo clube; nem há a obrigação do administrador da carteira de conferir os ditos extratos" (fls. 10)"...o administrador da carteira do clube foi enganado pelo administrador do clube, que, por sua vez, foi enganado pelos fraudadores" (fls.12). Em relação aos dividendos o Reclamante diz que "os dividendos que cabiam pela titularidade das ações desviadas também foram oportunamente creditados, o que também serviu para demonstrar que nada de irregular estava ocorrendo com as ações" (fl. 16). O Recorrente considera "estranho ... que a BVRJ não tenha dado ao recorrente a mesma possibilidade de se manifestar sobre o Relatório de sua Auditoria, como fez a BOVESPA. Se o tivesse feito, o recorrente teria tido a oportunidade de desfazer o engano cometido quando se tomou a tal referência ao administrador da carteira do clube como uma admissão de que não conferia os extratos de ações do clube" (fls. 26 e 27).
O Parecer da SMI, antes de apresentar sua conclusão, fez algumas observações sobre as alegações apresentadas:" quer pela legislação vigente, quer pelo contido no estatuto social do Clube, não resta nenhuma dúvida que o administrador do Clube, de 10 de novembro de 1994 até 14 de janeiro de 2001, sempre, foi a Reclamada ... entendemos que de fato só foi possível ao Reclamante, por seu representante, tomar conhecimento da falta das 1100 (mil e cem) ações da Cia. Vale do Rio Doce quando da solicitação de sua posição acionária atualizada junto à CLBC, tendo em vista que, até então, as informações que detinham fornecidas pelo administrador do Clube, não correspondiam à realidade pelas razões apresentadas, pela Reclamada, em sua manifestação contida às fls. 42 e 43 (parágrafos 4, 5, 6, 7 e 8). Quanto ao correto enquadramento da infração cometida, vale ressaltar que a presente reclamação reveste-se, quase que totalmente, das características encontradas no conhecido ‘Caso Seller’ decorrendo daí, em nosso entendimento, a aplicação de ressarcimento então adotada pelo Colegiado ... manifestamo-nos pela reforma da decisão recorrida pela BVRJ, devendo o Fundo de Garantia da BVRJ proceder ao ressarcimento ao Reclamante pelos prejuízos sofridos por falha na administração da custódia da Reclamada, que permitiu suas transferências indevidas de sua conta de custódia mantida na CLC, efetuadas entre 31/07/96 e 22/12/98, efetuando-se a devolução das 1.100 (mil e cem) ações da Vale do Rio Doce PNA, acrescidas de todos os direitos a ela relativos, contrariamente a ordem de permanência em custódia das ações reclamadas em conformidade com a aplicação da alínea ‘a’, item I, do artigo 41 do Regulamento anexo à Resolução CMN nº 1656/89" (fls. 33-36).
É o relatório.
Voto
A legislação vigente à época dos acontecimentos, qual seja, o Regulamento anexo à Resolução CMN nº 1.656/89, no artigo 41 enumera as hipóteses de ressarcimento pelo Fundo de Garantia:
"Art. 41. As Bolsas de Valores devem manter Fundo de Garantia, com finalidade exclusiva de assegurar aos clientes de sociedade corretora, até o limite do Fundo, ressarcimento de prejuízos decorrentes: 
I - da atuação de administradores, empregados ou prepostos de sociedade corretora membro ou permissionária da Bolsa de Valores que tiver recebido a ordem do investidor, em relação à intermediação de negociações realizadas em Bolsa e aos serviços de custódia, especialmente nas seguintes hipóteses:
a) inexecução ou infiel execução de ordens;
b) uso inadequado de numerário ou de valores mobiliários, inclusive em relação a operações de financiamento ou de empréstimos de ações para a compra ou venda em Bolsa (conta margem); 
c) entrega ao comitente de valores mobiliários ilegítimos ou de circulação proibida; 
d) inautenticidade de endosso em valor mobiliário ou ilegitimidade de procuração ou documento necessário à transferência de valores mobiliários;
e) encerramento das atividades;
II - de falha operacional na liquidação de operações e na administração da custódia de valores mobiliários; 
III - da atuação de administradores, empregados e prepostos da sociedade corretora que represente a contraparte da operação.
Parágrafo único. A reposição de valores mobiliários entregues à corretora para custódia é limitada a 150.000(cento e cinqüenta mil)Bônus do Tesouro Nacional, por cliente."
Segundo a BVRJ, o presente caso corresponderia à hipótese de ressarcimento do item II, por entender que houve "falha na custódia das ações". Já o Parecer da SMI entende que a hipótese aplicável é a da alínea a do dispositivo transcrito acima.
Contudo, entendo que este caso se identifica com a hipótese da alínea "b" do item I, visto que não houve autorização do Reclamante para a transferência das ações, a qual foi efetuada dolosamente, à luz do que dispõem os autos.
Quanto ao limite de 150.000 BTN, entendo que este não deve ser observado, por não ser aplicável a este caso. Fundamento minha opinião no conteúdo do despacho da PJU no MEMO/CVM/GJU-1/051/02, ora anexado aos autos, que estabeleceu:
"Tal dispositivo" (acima transcrito) "...somente tem aplicação à custódia realizada pela própria corretora, prática costumeira na época em que preponderava em nosso mercado bursátil a negociação de ações emitidas mediante certificado. Com o fenômeno da desmaterialização das ações, que passaram a assumir a forma escritural em praticamente todas as companhias negociadas em bolsa, a limitação constante do referido parágrafo único tornou-se um anacronismo, tanto que sequer foi reproduzida na Resoluçõa CMN nº 2.690, de 2000" (fls. 50).
Quanto à hipótese de ocorrência de prescrição, verifico nos autos que o reclamante só teve possibilidade de tomar conhecimento do prejuízo havido em 01 de janeiro de 2001, quando solicitou levantamento de sua posição acionária junto à Corretora Marlin (fls. 01 do Processo FG), visto que foi induzido a erro por créditos e pagamentos relativos à ações que não mais constavam em sua carteira, situação reconhecida pela própria BVRJ (cf. fls. 157 do Processo FG) e que o levaram a crer na normal situação de sua carteira. Portanto, o pedido de ressarcimento em 26 de janeiro de 2001 é tempestivo.
Assim sendo voto pelo acolhimento do recurso do reclamante, salientando que entendo não ter havido prescrição, devendo o Fundo de Garantia da BVRJ, portanto, efetuar o ressarcimento de 1.100 ações PNA de emissão da Cia. Vale do Rio Doce, na forma da letra a do parágrafo primeiro do art. 44 da Resolução CMN 1.656/89(1), aplicável ao caso, não havendo que se cogitar da incidência do limite de 150.000 BTNs, como já explanado.
É o meu voto.
Rio de Janeiro, 18 de junho de 2002
Wladimir Castelo Branco Castro
Diretor Relator
(1) "Art. 44 - As indenizações devem ser efetuadas em valores da mesma espécie, sendo que aquelas em numerário serão atualizadas monetariamente, de acordo com o índice oficial definido pelo governo, para manutenção do poder aquisitivo da moeda e acrescidas de juros de 12% (doze por cento) ao ano, devidos a partir da data em que ocorreu o prejuízo.
                  § 1º - Quando o prejuízo importar em perda de valores mobiliários:
a.     a indenização consistirá na reposição de valores mobiliários do mesmo emissor, tipo, espécie e classe, acrescidos de quaisquer direitos distribuídos em relação aos mesmos, no período entre a ocorrência do prejuízo e a indenização, inclusive os que dependam de manifestação de vontade;
b.    o reclamante poderá, quando da propositura da reclamação, optar pela indenização em numerário, a qual corresponderá ao valor de mercado do título na data da ocorrência do prejuízo, atualizado nos termos deste artigo e acrescido de juros de 12% (doze por cento) ao ano;
§ 2º - Para efeito da indenização de que trata a alínea " b" do parágrafo anterior, considera-se valor de mercado do título a sua cotação, média, na data da ocorrência do prejuízo, na Bolsa de Valores em que tiver sido mais negociado."
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