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Decisão do colegiado de 26/04/2002

Participantes

JOSÉ LUIZ OSORIO DE ALMEIDA FILHO - PRESIDENTE
LUIZ ANTONIO DE SAMPAIO CAMPOS - DIRETOR (*)
NORMA JONSSEN PARENTE - DIRETORA (**)
WLADIMIR CASTELO BRANCO CASTRO - DIRETOR

(*) Não participou da discussão dos itens 11 (PROC. RJ2002/2230), 12 (IA 19/00), 13 (PROC. RJ2000/0250), 14 (PROC. SP2001/0439), 15 (PROC. SP2001/0725), 17 (PROC. SP2000/0314) e 20 (Pós Graduação)
(**) Não participou da discussão dos itens 3 (PROC. RJ2002/2013) , 4 (PROC. RJ2002/2196), 5 (PROC. RJ2002/1974) e 19 (Alteração Instrução 302/99)

RECURSO CONTRA A DECISÃO DA SMI EM PROCESSO DE FUNDO DE GARANTIA - BOVESPA - PROC. SP2001/0439

Reg. nº 3468/01
Relator: DNP
O Colegiado acompanhou o voto da Diretora-Relatora, abaixo transcrito:
"PROCESSO: CVM Nº SP 2001/0439 (RC Nº 3468/2001)
INTERESSADO: Luiz Alberto Basile (Marlin S/A CCTVM)
ASSUNTO: Recurso contra decisão da SMI em processo de fundo de garantia
RELATORA: Diretora Norma Jonssen Parente
VOTO
RELATÓRIO
1. Em junho de 2001, o reclamante recebeu correspondência da Marlin pedindo para entrar em contato com os Srs. Wilson ou André para tratar de assunto relacionado a títulos registrados em seu nome, oportunidade em que tomou conhecimento do ocorrido.
2. Em razão disso, em 19.06.2001, encaminhou reclamação ao fundo de garantia da Bolsa de Valores de São Paulo – BOVESPA solicitando a reposição de 200 ações PNA de emissão da Companhia Vale do Rio Doce que não constavam de sua conta de custódia mantida através da Marlin.
3. Pelo reclamante foram prestadas as seguintes informações:
a) entre março e abril de 1999 obteve, por telefone, junto à Marlin sua posição acionária ao final de 1998 para a declaração do imposto de renda, tendo sido informado que possuía 232 ações de emissão da Vale do Rio Doce, entre outras;
b) em novembro de 1999 passou a receber da CLC sua posição de ações em custódia e ficou surpreso ao verificar que o documento indicava a existência de apenas 32 ações da Vale;
c) imaginou tratar-se de algum grupamento de ações e, como estava trabalhando em São Paulo desde março de 1999, não houve a disponibilidade de tempo para obter mais informações a respeito.
4. Ao apurar os fatos, a BOVESPA constatou através de auditoria que as 200 ações PNA de emissão da Vale haviam sido transferidas da conta de custódia do reclamante da BVRJ/CLC para a conta da cliente Marizes de Assis Souza na CBLC em 31.07.98 sem qualquer autorização.
5. Instada a se manifestar pela BOVESPA, a Marlin concluiu que, uma vez atendidos os pressupostos legais para a sua concessão, o pedido de ressarcimento devia ser acolhido pelo fundo de garantia por ser medida de inteira justiça. Por sua vez, perguntado em que momento tivera conhecimento dos fatos alegados na reclamação, o reclamante informou que só ficou sabendo em junho de 2001 quando recebeu correspondência da Marlin pedindo para entrar em contato com o Sr. Wilson para tratar de assunto relacionado a títulos registrados em seu nome.
6. Ao analisar o processo, a BOVESPA decidiu que o pedido de ressarcimento estava prescrito, ou seja, a apresentação do pedido de ressarcimento era intempestiva, tendo em vista que:
a) a transferência irregular para a conta de custódia de terceiro ocorrera em 31.07.98;
b) o reclamante não recebia todos os extratos emitidos pela CLC, devido à mudança de endereço não informada à reclamada ou à CLC; 
c) quando voltou a receber os extratos da CLC com a posição de ações reduzida para 32 ações Vale, o reclamante julgou ter ocorrido grupamento e não tomou nenhuma medida para se certificar disso;
d) o reclamante foi informado da falta das ações em junho de 2001 pela própria reclamada;
e) a reclamação foi apresentada à BOVESPA em 19.06.2001.
7. Informado da decisão, o reclamante manifestou-se no seguinte sentido:
a) o prazo de prescrição decorre a partir de junho de 2001;
b) a Marlin só informou à Superintendência Geral da BOVESPA a ocorrência da fraude em 10.01.2001;
c) não pode ser acusado ou taxado de negligente ou inerte quem estava desempregado e ocupava 15 horas ou mais de seu dia para voltar ao mercado formal de trabalho e, quando conseguiu em março de 1999, tinha que se deslocar semanalmente do Rio para São Paulo.
8. Ao apreciar a presente reclamação em conjunto com outras que envolvem a Corretora Marlin, a SMI concluiu pela reforma de todas as decisões da BOVESPA analisadas no Parecer/CVM/GMN/030 de 09.10.2001 que julgaram improcedentes os pedidos de ressarcimento sob a alegação da ocorrência de prescrição, devendo a Bolsa analisar o mérito das reclamações no prazo de 20 dias, por entender que:
a) ficou demonstrado nos autos que se um determinado cliente detectasse divergências entre a posição que julgava ter com a que lhe fosse apresentada através dos avisos encaminhados pelos correios teria ele sua posição prontamente recomposta, afastando assim qualquer suspeita que pudesse levar adiante;
b) os reclamantes não tiveram comprovadamente a possibilidade de acesso a elementos que lhes permitiriam tomar ciência dos prejuízos havidos, uma vez que a ação dos fraudadores era de tal modo engendrada que até os diretores da corretora, os auditores da BOVESPA/BVRJ, bem como o auditor independente, não puderam detectar elementos que lhes permitiram tomar ciência das fraudes;
c) o prazo prescricional deve ser contado a partir de quando se tornaram públicas as fraudes praticadas pelos funcionários da corretora reclamada.
9. Da decisão da SMI, a BOVESPA apresentou recurso para que a matéria relativa à prescrição fosse apreciada pelo Colegiado, alegando o seguinte:
a) a BOVESPA só decidiu pela prescrição quando realmente ficou comprovado que houve negligência, inércia e descuido por parte dos reclamantes;
b) não há motivo para a SMI solicitar que a BOVESPA julgue o mérito, pois no recurso apresentado o mérito destes processos já foi devidamente analisado. À Bolsa só interessa que o Colegiado aprecie a questão da prescrição;
c) a prescrição, no caso, foi reconhecida porque o reclamante admitiu que recebia os extratos de custódia que refletiam a falta das ações mas que achou que houvesse ocorrido um grupamento e não buscou esclarecimento algum;
d) como as transferências irregulares ocorreram na CLC, caso seja afastada a prescrição, a reclamação deveria ser objeto de apreciação e ressarcimento pelo fundo de garantia da BVRJ estando o ressarcimento também sujeito ao limite de 150.000 BTN’s previsto no parágrafo único do artigo 41 da Resolução nº 1656/89 do Conselho Monetário Nacional.
10. Devidamente consultada, a PJU se manifestou no seguinte sentido:
a) embora o envio aos investidores de avisos de negociação ou de movimentação de ações possa ser concebido como bastante para caracterizar a ciência da ocorrência de danos decorrentes de transferências desautorizadas, essa presunção é desconstituída na hipótese em que prepostos da instituição intermediária fornecem informações falsas induzindo mediante ardil seus clientes a erro;
b) o disposto no parágrafo único do artigo 41 da Resolução nº 1656/89 não se aplica à hipótese dos autos, tendo aplicação somente à custódia realizada pela própria corretora.
FUNDAMENTOS
11. A primeira questão a ser discutida no presente processo diz respeito ao momento em que o reclamante teria tomado ciência do prejuízo e se a reclamação teria sido apresentada no prazo de seis meses previsto na Resolução nº 1656/89, vigente à época dos fatos. A propósito, o parágrafo 2º do artigo 42 estabelece o seguinte:
"Art. 42 - ..................................................................................
§ 2º - Quando o comitente não tiver tido comprovadamente possibilidade de acesso a elementos que lhe permitam tomar ciência do prejuízo havido, o prazo estabelecido no parágrafo anterior será contado da data do conhecimento do fato."
12. Ora, de acordo com o processo, as 200 ações, do total de 232, de emissão da Vale foram indevidamente retiradas da conta de custódia do reclamante em 31.07.98. Posteriormente a esse fato, verifica-se que o reclamante obteve sua posição junto à Marlin para a declaração do imposto de renda em que em 31.12.98 constavam as referidas ações.
13. Dessa forma, à vista da relação de fidúcia que existe entre o cliente e a corretora, considero razoável a postura do reclamante de, apesar de ter recebido em novembro de 1999 o extrato da CLC em que as ações reclamadas não constavam mais de sua custódia, não ter procurado obter maiores informações a respeito por estar trabalhando em São Paulo e que imaginou tratar-se de grupamento. 
14. É oportuno ressaltar que o extrato em anexo não contém as informações sobre o que teria ocorrido com as ações e que quando houve a transferência indevida das ações em julho de 1998 o endereço do reclamante no sistema já era o correto, conforme se verifica do cadastro efetuado em 19.05.98 na BOVESPA/CBLC.
15. Diante disso e considerando que o reclamante sequer tomou conhecimento do prejuízo quando o problema de fraude na Marlin se tornou público mas somente após o recebimento de correspondência da própria Marlin pedindo-lhe que entrasse em contato com a corretora em junho 2001, não me parece correta a conclusão da BOVESPA no sentido de que a reclamação teria sido apresentada fora do prazo já que foi formulada em seguida à ciência do prejuízo.
16. Quanto ao mérito, não há como deixar de reconhecer que a responsabilidade pela transferência de titularidade de ações de clientes por funcionários para a conta de terceiro é do fundo de garantia que abrange toda e qualquer hipótese de dano causada a investidor por empregados ou prepostos de sociedade corretora que utiliza dos sistemas de negociação em bolsa para perpetrar fraudes. No caso, embora não esteja prevista expressamente, entendo que a fraude pode ser enquadrada na hipótese da alínea "b" do item I do artigo 41 da Resolução nº 1656/89 do Conselho Monetário Nacional que dispõe:
"Art. 41 – As Bolsas de Valores devem manter Fundo de Garantia, com finalidade exclusiva de assegurar aos clientes de sociedade corretora, até o limite do Fundo, ressarcimento de prejuízos decorrentes:
I – da atuação de administradores, empregados ou prepostos de sociedade corretora membro ou permissionária da Bolsa de Valores que tiver recebido a ordem do investidor, em relação à intermediação de negociações realizadas em Bolsa e aos serviços de custódia, especialmente nas seguintes hipóteses:
...................................................................................................
b) uso inadequado de numerário ou de valores mobiliários, inclusive em relação a operações de financiamento ou de empréstimos de ações para a compra ou venda em Bolsa (conta margem);"
17. Quanto ao limite de 150.000 BTN’s pleiteado pela BOVESPA em caso de ser reconhecida a responsabilidade do fundo, previsto no parágrafo único do artigo 41 da mesma Resolução, cabe esclarecer que, na presente reclamação, o valor a ser ressarcido está muito aquém desse limite.
CONCLUSÃO
18. Ante o exposto, VOTO pelo não acolhimento do recurso da BOVESPA por entender que não ocorreu a prescrição e, no mérito, pelo acolhimento da reclamação, o que importará na reposição das ações reclamadas, sendo que eventuais direitos distribuídos em espécie deverão ser corrigidos pela variação do IGP-M da Fundação Getúlio Vargas, conforme decisão do Colegiado de 13.02.2001, e acrescidos de juros de 12% ao ano a partir da data em que ocorreu o evento até o efetivo pagamento, nos termos do artigo 44 da Resolução nº 1656/89 do Conselho Monetário Nacional, ou apenas acrescidos de juros, nos termos do artigo 43 da Resolução nº 2690 dependendo de quando ocorreu o evento.
Rio de Janeiro, 26 de abril de 2002.
NORMA JONSSEN PARENTE
DIRETORA-RELATORA"
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